terça-feira, 29 de janeiro de 2013


 

O clima e a cultura dos brasileiros

 Na década de 1970 convivi e trabalhei com quase duas centenas de especialistas, pesquisadores e professores norte americanos. Muitos deles aqui vieram para trabalhar em períodos curtos e longos. Outros lá mesmo em sua própria terra. Um deles, especialmente, ao observar a cultura e os costumes do povo brasileiro, em pleno carnaval no Rio de Janeiro,  disse-me certa vez, num jantar em hotel de luxo e sob o barulho da agitação dos desfiles carnavalescos: “O problema do Brasil é que aqui não tem inverno”. Soou-me estranhíssima aquela observação do visitante e morador da região dos Grandes Lagos, da terra do Tio Sam, onde o inverno é mais que rigoroso. Se quiser sair de casa tem que trabalhar com a pá e remover montanhas de mais de metro de pura neve na sua porta. Melhor ficar em casa mesmo com o conforto da calefação.

 Recentemente, com a morte do escritor Ivan Lessa, que passou boa parte de sua vida em Londres, publicaram uma frase sua que dizia: ”O frio civiliza”. Poucos entenderam o recado desse escritor que ficara famoso por suas tiradas contra a ditadura militar no famoso jornal O Pasquim. Ao contrário, eu a entendi perfeitamente, pois, quando ouvi algo semelhante do executivo e professor americano eu o inquiri por que razão ele dizia aquilo. Simples, retrucou ele, os brasileiros não tinham tempo para se recolherem em casa, ler e estudar muito, viver literalmente confinado junto a outras pessoas e com isso refinar o intelecto e as boas maneiras.  Caramba! Foi um tiro de misericórdia na situação de grosseria que acabávamos de enfrentar, no restaurante de um hotel de luxo no Rio de Janeiro, justamente a cidade mais turística do país naqueles idos de 1977.

Hoje, 35 anos depois, foi reproduzida pelos jornais aquela frase atribuída ao escritor Ivan Lessa. Pensando bem e com a alma mais destravada, longe do constrangimento e a estupefação diante dos acontecimentos em que me vi envolvido na ocasião, estou convencido que ambos, o professor americano e o escritor Lessa, estão mais que corretos. Eles nada mais ressaltaram nossa falha cultural em face das condições de clima e temperatura. As baixíssimas temperaturas do hemisfério norte não são nada convidativas para se colocar a cara fora de casa... por isso leem e estudam mais. Por aqui, no país tropical, qual brasileiro sacrificaria sua ida à praia ou outro passeio qualquer nos finais de semana ensolarados, o ano inteiro? E as baladas nas noites quentes de verão? Ah... seria esperar demais que eles passassem três meses confinados em casa, lendo e estudando com afinco, sobretudo naquelas priscas eras anteriores à internet.

Brasília, 17 de junho de 2012

Paulo das Lavras 

 
 O prof Hunter, em plena primavera em Michigan/EUA, fez-me lembrar do rigoroso inverno
dos meses de dezembro a fevereiro, quando a neve se acumula à porta de sua casa
Foto do autor- MSU , junho de 1977





Nenhum comentário:

Postar um comentário