quarta-feira, 28 de abril de 2021

A vida no Seminário - A rotina de um internato

Notas Preliminares

       Esta crônica se constitui no Capítulo 4.1 do livro “Um Seminário na Década de 1950”. A obra conta a história do menino que decidiu, por contra própria, seguir para o distante Seminário para se tornar sacerdote. Tudo girava em torno de sua vocação religiosa e a família tratou de apoia-lo. Entretanto, o menino de apenas 12 anos de idade não imaginava o quão dura seria a vida longe de casa. 

   O livro contém nove capítulos e ainda se encontra em fase de revisão. Alguns capítulos já foram publicados neste blog, cujos links estão indicados ao final desta crônica.

 


O primeiro dia no Seminário

            O Seminário N.S. de Fátima funcionou de 1954 a 1968 em um belíssimo prédio situado no centro de Itaúna-MG. Anexo a ele e ocupando a fachada da rua funcionava o Colégio Sant´Ana que também aceitava alunos externos, da cidade e região. Ocupava enorme área e distava apenas um quarteirão da igreja matriz, na principal praça da cidade. No Colégio estavam matriculados os 70 meninos seminaristas, internos, e outro tanto de alunos externos. O Colégio, que ainda hoje funciona, incorporou toda a infraestrutura do antigo seminário que fechou suas portas nos anos 60. A maioria dos seminaristas era de meninos de até 14 anos de idade. Eram procedentes em grande parte do próprio estado de Minas Gerais, mas havia alguns de São Paulo, outros da região nordeste e até mesmo do norte. Naquele tempo havia dois tipos de seminário para a formação de sacerdotes. O Seminário Menor, como o de Itaúna, recebia meninos dos 12 aos 17 anos para os estudos de segundo grau, ou ensino médio, os antigos ginásio e colegial. Já o Seminário Maior, de nível superior, incluía os estudos avançados de Filosofia e Teologia como formação final do clérigo.

 Chegamos ao Seminário no dia 11 de fevereiro de 1958, ano da Copa Mundial de Futebol, quando, aliás, o Brasil sagrou-se campeão pela primeira vez e trouxe a Taça Jules Rimet. As aulas do curso ginasial seriam iniciadas depois do carnaval, dali a uma semana. Os novatos chegavam bem antes do início das aulas de modo a se adaptarem à rotina interna do Seminário.  O nosso primeiro dia no seminário foi diferente, de muita emoção. Não bastasse a tensão da despedida do pai e da irmã, ali no grande portão de entrada, com a sensação mais dolorida e marcante que o menino experimentara em toda a sua vida, as emoções daquele dia se sucediam a cada momento seguinte.  Chegando logo após o almoço, fui conduzido à presença dos amiguinhos de Lavras, Pedro Júlio e Miguel Cesar. Outro seminarista, Clóvis Augusto Ribeiro, veterano e mais velho, natural da pequena cidade de Inimutaba, próxima à Curvelo, também estava ali e seria o meu tutor durante todo o ano, conforme a praxe naquele internato. Ensinar-me-ia as regras, horários e tudo mais que regia a vida no Seminário. Levaram minha mala de viagem para dormitório e ajudaram-me a organizar as roupas no pequeno armário de apenas 90 cm de largura por 1,10m de altura. Lá já estava a grande e pesada canastra, despachada dias antes pela ferrovia, com as roupas de cama e todo o enxoval cuidadosamente preparado pela família. Organizamos tudo nos devidos lugares, inclusive estendendo o lençol na cama, travesseiro enfronhado e colcha de piquê, branca, com desenhos geométricos. Todas as peças de roupa, inclusive as toalhas, tinham bordadas as iniciais do nome do menino e ainda mantinham o perfume de casa. Estava tudo em ordem no baú, roupas bem dobradinhas como a mãe e as irmãs as arrumaram ali em casa, na minha presença e explicando sobre cada peça de roupa, como e quando usá-la.

Desfazer as malas e acondicionar as roupas no pequeno armário foi uma tarefa cheia de reminiscências. A cada peça de roupa ou objeto que pegava vinha à memória a presença de minha mãe e da irmã mais velha. Foram elas que tudo fizeram, desde a compra dos cortes dos tecidos, perguntando-me se gostava da cor ou da padronagem até à confecção da peça, em casa, tirando medidas e fazendo-me provar a toda hora. Nunca havia pensado antes que coisas tão simples assim pudessem causar tantas emoções de saudade e amor no coração. A distância e a ausência dos entes queridos faziam crescer a saudade a cada peça de roupa, a cada objeto retirado da mala ou da abarrotada canastra. Aquilo desencadeava no menino uma vontade louca de tudo deixar e sair correndo para a estação do trem e nele embarcar de volta com o pai e a irmã que partiriam às cinco horas daquela tarde. Mas, as presenças dos dois coleguinhas e do recém conhecido tutor, que ajudavam na preparação do dormitório, não permitiram que as lembranças prosseguissem e dessem vazão às lágrimas reprimidas. Estas só apertaram para valer à noite, quando apagadas as luzes e todos já recolhidos, o menino desabou em pranto silencioso no travesseiro que ainda tinha o doce cheiro de casa. Com o coração dilacerado pela falta da família em sua primeira noite fora de casa, sozinho ali com seus pensamentos o menino demorou a pegar no sono. Naquele primeiro dia passou boa parte da noite em prantos, numa sensação nunca antes experimentada. Longe da família pela primeira vez e com um longo ano pela frente em ambiente totalmente estranho e submetido à rigorosa rotina, à base do apito como numa ordem unida de militares no quartel. Definitivamente, foi bastante dura para o menino aquela primeira noite longe de casa.

Terminada a arrumação das roupas fomos conduzidos à Sala de Estudos. Ali se encontravam todos os seminaristas. Entramos pela porta lateral, ao final do dormitório e já de frente para os seminaristas, o diretor apresentou-nos como o novato que acabara de chegar do sul de Minas e pediu uma saudação de acolhida. Encerrada a apresentação com calorosa salva de palmas de boas vindas, um pouco constrangido e com o coração batendo forte, o menino já sentindo o peso da saudade custou a segurar o choro. Respirou fundo e encarando a plateia pensou: Aqui estou e esses são de agora em diante os meus coleguinhas e todos têm a mesma vocação que eu, de servir a Deus no sacerdócio. Que Ele esteja aqui comigo por todos os dias e me dê forças para vencer. Amém! Agradeci e cumprimentei a todos com um aceno e ato contínuo, dirigi-me à mesinha que nos fora reservada. Semelhante a uma carteira de sala de aula, a mesinha individual tinha o tampo dividido ao meio, com cada metade abrindo-se para cima e para os lados. Ali, guardávamos todos os livros, cadernos e demais pertences escolares numa espécie de caixote de uns vinte centímetros de profundidade.

À frente da grande sala de estudos ficava a mesa do regente/tutor sobre um tablado elevado. Ainda à frente, à esquerda e ao lado da porta de entrada exclusiva ao dormitório dos meninos, ficava porta do escritório/dormitório do padre Adriano, diretor geral do Seminário. Sua cama era tipo um beliche dobrável sob a estante de livros. Quando recolhida, dobrada para cima e encostada no fundo da estante, ficava encoberta por uma cortina de correr. Assim, quem lá entrasse não notaria sua cama retrátil sob a estante de livros. Dali, de seu quarto/escritório, o diretor tinha controle total sobre a sala de estudos e do dormitório dos meninos menores. O dormitório dos maiores ficava simetricamente oposto ao primeiro e entre eles o hall das escadarias e as instalações sanitárias. Estas tinham seis boxes de chuveiro e igual número de instalações sanitárias. Os lavatórios, em maior quantidade, eram dispostos logo à entrada, revestidos de azulejos e eram comuns a todos os seminaristas, maiores e menores.

Naquela primeira quinzena de fevereiro ainda era período de férias e não havia deveres escolares e nem lições a estudar, portanto o tempo na Sala de Estudos era livre. Muitos cuidavam de coleções de selos, outros liam livros diversos e havia musica ambiente, clássica ou sacra. Logo em seguida foram todos liberados para o futebol e por ser o primeiro dia do novato, apenas assistimos aos revezamentos de times nos dois campos de futebol.  Terminado o tempo, subimos para o banho. Surpresa..., banho frio de cortar a respiração e o tempo era cronometrado. Três minutos e o apito soava. Tínhamos que sair em 30 segundos após o estrilar do apito, que soava como no futebol.

Certa vez atrasei-me no chuveiro, ainda todo ensaboado e tentando retirar manchas de tinta dos trabalhos manuais, não foi possível atender ao apito com a ordem de saída. Afinal, o tempo muito curto, três minutos apenas, para se ensaboar e enxaguar o corpo. Fizesse assim em casa, nesse curto tempo, certamente a mãe iria inspecionar se o banho foi bem tomado. Ainda ensaboado fechei o registro do chuveiro, fiquei quietinho, esperando a nova turma da fila entrar. Não adiantou, pois chegaram seis meninos, numero exato de boxes com chuveiro. Sobrou um pelo lado de fora e ele sabia que, quem quer que ali estivesse trancado, deveria dar-lhe o lugar. Bateu, bateu, gritou discretamente..., não restou alternativa senão enrolar-me na toalha, ainda que ensaboado e sair. Voltei para o final da fila, não sem antes ser abordado pelo padre regente da disciplina. De longe, quase no final da fila, ele levantou os olhos do breviário que lia (todos eles liam o breviário enquanto nos supervisionavam, em qualquer lugar. O breviário era um livro com os ofícios e orações diárias de um sacerdote) e acompanhou-me com olhar até passar por ele, quando me inquiriu. Por ser novato fui perdoado, mas aprendi a lição e percebi que o rigor dos holandeses era maior que dos padres alemães do colégio em Lavras de onde viera. Fazia-nos lembrar do rigor do sargento do Exército, comandante do Tiro de Guerra, terror das mães que viam seus filhos se atirarem nos brejos, riachos e montanhas pedregosas a um simples apito ou grito de ordem do militar. Sair ensaboado do chuveiro foi o primeiro “mico” que o menino pagou no internato. Porém, o ambiente era muito respeitoso e ninguém se aproveitava das falhas ou faltas dos colegas. Havia muita disciplina e respeito entre todos os meninos.

A primeira noite no internato

Encerrado o banho, todos já vestidos, descemos em fila para o refeitório. Às 18 horas era servido o jantar. Conduziram-me a uma mesa para seis meninos. O chefe da mesa ficava ao centro, tendo um menino a cada lado e os outros três em frente. Clóvis era o chefe e ao mesmo tempo meu tutor. Fazia-se breve oração, assentávamos e o chefe determinava a dois dos membros da mesa que fossem ao balcão da cozinha buscar as travessas com as iguarias. Encerrado o jantar outros dois levavam os pratos e talheres usados até à cozinha. Seguia-se breve recreio, ali mesmo do lado de fora do prédio, sob as mangueiras e às 19:00 horas iniciava-se a reza do terço, na capela ao lado do refeitório. Essa oração era transmitida pela Rádio de Itaúna, por um link físico, fios que interligavam o Seminário à estação da rádio emissora local. Ao final do terço cantávamos um hino sacro, acompanhado pelo órgão, tocado pelo Padre Luiz Turkenburg.  Após o terço subíamos para a sala de estudos, onde permanecíamos até as 21:45h e em seguida para o dormitório. Antes de nos dirigirmos para o dormitório fazíamos ligeira oração, ajoelhados sobre as cadeiras das escrivaninhas agradecendo pelo final da jornada. Dalí seguimos então para o dormitório e após escovar os dentes arrumamos a cama, o travesseiro, virol e colcha de lã, tarefa que o menino nunca fizera antes em casa, pois a mãe sempre o fazia e era só chegar a deitar-se. Nunca precisou fazer a cama para dormir, pois havia, ainda, permanentemente agregada em casa, a figura da empregada da família sempre à disposição, conforme costume da época. Agora, ali estava a fazer aquela simples tarefa, pensando no carinho, o aconchego de casa com todos os familiares ao redor. Foi preciso faltar isso, tendo o próprio menino que cuidar de si pela primeira vez para, então, lembrar-se do quanto era importante e amoroso aquele simples ato de arrumar a cama para se deitar. Feito isso, ajoelhado no chão de tacos de ipê e curvado sobre a pequena cama patente, fazia a última oração individual, pedindo as bênçãos de Deus para si e para os familiares que se encontravam distantes.

 Aquela primeira noite foi dolorida demais para o menino, pois as emoções estiveram à flor da pele durante todo o dia. Um turbilhão passava pela sua cabeça, a dor da despedida do pai e da irmã, a arrumação das roupas no armário e da cama, a apresentação aos coleguinhas, a rotina diária com extremo rigor de horários, o banho gelado que o menino nunca se acostumou, as atitudes comedidas e o quase  silêncio total em todos os ambientes que não fossem o local de recreio... Enfim, tudo era novidade e as emoções se acumularam. Terminada aquela ligeira prece, ajoelhado no chão, o menino se recolheu cobrindo-se e desabou em silencioso choro provocado por tantas emoções e até mesmo pelo cheirinho perfumado das roupas de cama e do próprio pijama. Tudo evocava lembranças de casa, dos entes queridos que com ele também vivenciaram o sonho de ir para o Seminário. Mal se deitara e as lágrimas corriam intensas no travesseiro e talvez já prevendo essa situação, aproximou-se o Pe. Adriano. Abaixou-se, perguntou se estava tudo bem e num gesto de atenção especial, enfiou as bordas do cobertor e lençol sob o colchão, de ambos os lados da cama... “assim é melhor, não cairão durante a noite”, disse ele. Entretanto, o sono custou a chegar, mas, gostei da colcha de lã e virol enfiados, com certa folga, sob o colchão e desde então passei a fazer isso e de fato nunca mais caíram ao chão durante o sono.

Assim encerrou-se aquele primeiro dia no Seminário. Tudo era novidade e o menino a tudo observava com atenção e interesse. Estava feliz porque a partir de então iniciava-se a realização do sonho de ser padre. Mas, contudo, na hora em que se apagaram as luzes e já sob as cobertas e mesmo tendo sido maravilhosamente recebido, com tantas atenções a ele dispensadas e ainda a certeza de que ali era o lugar certo para cumprir a vocação de um dia ser padre, celebrar missa, fazer sermão, ensinar em escolas..., o menino de 12 anos, que nunca saíra de casa... desabou, pois nunca imaginara o quão duro era estar ali, sozinho, como naquele primeiro dia longe de casa, dos entes queridos. Durante todo o tempo em que ali esteve e em todas as noites,  sempre pedia a Deus que lhe desse graça e força para vencer e realizar a sua vocação.

O dia seguinte e o staff do Seminário

Em período de férias a rotina e as atividades eram mais leves. O Seminário N.S. de Fátima, esse era o nome do seminário de Itaúna, contava com vários religiosos holandeses e dentre eles se destacavam os padres Adriano Turkenburg (Adrianus Petrus Turkenburg – 1920/Amsterdam - 2006- Sete Lagoas MG) diretor geral e Luiz Turkenburg, irmãos de sangue; José Wetzels (1925- Bocholtz/Maastricht, Holanda – 2012- Itaúna MG), chamado carinhosamente de padre José das Crianças; padre Francisco; padre Geraldo, bem jovem e recém-chegado da Holanda e outros além do Irmão João, também holandês e que fazia todos os serviços de manutenção hidráulica, elétrica, carpintaria e ainda exercia o ofício de pedreiro e pintor de paredes. Era o engenheiro das instalações prediais e mestre de obras. Havia apenas um único brasileiro, o padre Manoel de Lima Cauper. Todos exerciam alguma função. Padre Francisco, por exemplo, era o tesoureiro. Além das mensalidades e finanças, cuidava também do controle do dinheiro que os pais deixavam depositado para despesas eventuais. Gostávamos de todos eles, pois sempre nos tratavam com carinho e respeito. Lógico que o padre diretor era temido por conta da severa disciplina que impunha a todos, mas nunca destratou ou ofendeu nenhum menino. Sempre nos tratava com autoridade respeitosa. O padre Luiz era dos mais queridos, pelas aulas de inglês que o menino gostava e também como regente do coral, além de ser ótimo no piano e no órgão/ harmônio. Estava sempre a nos brindar com belíssimas performances nos horários de recreio. Também o padre Francisco era bastante querido, pois mesmo com sequelas físicas sofridas na Segunda Grande Guerra e sempre mancando da perna direita, que parecia ser bem mais curta. Foi vítima de uma tragédia acontecida na sua cidade natal, na Holanda. Contou-nos, aos novatos, curiosos como toda criança, sobre as deformações de seu rosto, perna e todo o corpo. Encontrou um objeto estranho em uma praça, sob um vão da calçada. Tinha o formato de uma pera, com bico e um pino atravessado. O garoto pôs-se a soprá-lo, pois não sabia tratar-se de uma granada. Puxou o pino e o artefato explodiu em seu rosto. Uma tragédia, embora ele minimizasse a narrativa de modo a não impressionar em demasia os meninos que a essa altura já estavam de olhos arregalados e outros até chorando. Submeteu-se a várias cirurgias corretivas com implante de pele na face, nas mãos e outras partes do corpo. Estilhaços da granada causaram-lhe também grande estrago na perna direita. Milagrosamente nada sofreu nos olhos. Era fácil entender por que ele minimizava os efeitos da explosão em seu corpo, pois, muitos dos garotos consternados com a tragédia faziam perguntas com lágrimas nos olhos. Também por isso, certamente, era dos mais queridos do Seminário, além de ser extremamente alegre e animado nas brincadeiras com os meninos, especialmente no futebol. Gostava de jogar como goleiro, pois tinha dificuldade para correr, devido à deficiência física de sua perna. Sempre tinha um sorriso para os meninos, embora sua face ligeiramente deformada também tivesse profundas cicatrizes provocadas pela explosão da granada. 



 

 Havia ainda outro padre que sempre exprimia alegria junto às crianças, o Padre José Wetzels. Era só alegria e nos contava casos de suas viagens em busca de novas vocações, além de também jogar futebol com a meninada. Vestia uma bermuda preta até os joelhos, enquanto o padre Francisco nunca tirava sua batina branca, talvez para não expor suas sequelas físicas. Mas, havia uma vantagem no goleiro de batina..., pois nunca tomava uma bola ou um gol no meio das pernas, considerada a maior vergonha de qualquer goleiro, pois a batina funcionava como cortina intransponível. Esses eram os padres holandeses que mais de destacavam. Havia apenas um sacerdote brasileiro, ali no Seminário, o amazonense Padre Cauper, que tocava violão e cantava as músicas folclóricas, como aquela do “Mestre Domingos, o que é que você quer? Eu não vim fazer barulho..., eu só vim “tumar” o seu café....”. Aonde quer que ele chegasse formava-se logo a rodinha e causos e violão com cantorias nunca faltavam.

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      Na cozinha a Dona Fia comandava uma equipe com mais duas ajudantes. Os padres usavam pequenas motocicletas holandesas como meio de transporte para as idas ao centro da cidade ou visitar bairros onde celebravam missas. Havia pelo menos duas delas. Seriam correspondentes a uma Mobilete de 125 cc de cilindrada. Tinham um cuidado especial ao dirigi-las, pois contavam que um colega morreu, na Holanda, ao prender acidentalmente o cordão da batina na corrente motora. Portanto, sempre davam um jeito de enrolar um pouco a batina e principalmente as pontas do enorme do cordão que mesmo passando pela cintura ainda quase chegava aos pés.


A rotina durante o ano letivo

O dia dos meninos seminaristas era rigorosamente controlado pelo relógio e o apito dos padres Adriano e Luiz. Às vezes também o padre Francisco atuava nessa função. Sempre com o breviário nas mãos, lendo a palavra de Deus, eles caminhavam por entre as fileiras das carteiras da sala de estudos ou onde quer que estivéssemos reunidos. Impunham disciplina draconiana, mas, aqui cabe um parêntesis sobre a disciplina. Era respeitosa e ao contrário de relatos de outros colegas seminaristas, de épocas diferentes, nunca vi ou presenciei reprimendas publicas ou mesmo os famosos castigos humilhantes de se ficar de pé na frente da turma, tanto em sala de aula como nos demais ambientes.  Nada disso aconteceu naquele ano. Bastava um olhar de qualquer que fosse o supervisor e já era o bastante para o menino entender e cessar sua estripulia. 

 A jornada começava cedo com o despertar às 05:45 horas. Num leve bater de palmas todos acordavam e o Padre Adriano nos saudava em Latim: Benedicamus Dominum e respondíamos: Deo gratias e saíamos apressados, de chinelos e toalha de rosto no pescoço e escova de dente à mão já com a pasta dental, o dentifrício como dizíamos. Tínhamos 15 minutos para nos aprontar, descer as escadas em fila e ir direto para a capela. O Padre Adriano nem tirava os olhos do breviário e nós, os meninos nos púnhamos a correr para o banheiro e logo pegar a fila dos lavatórios para escovar os dentes e voltar correndo, tirar o pijama, dobrá-lo, vestir roupa do dia, arrumar a cama e deixar tudo em ordem. Ainda bem que éramos meninos imberbes e não tínhamos que fazer a barba, pois se assim fosse, os 10 minutos não seriam suficientes. Cinco minutos antes das seis horas o apito tocava e entrávamos em fila para descer as escadas em direção à capela. Às 06h00min horas em ponto começava a missa. Interessante que sempre fui devagar, lento, para me levantar pela manhã, mas ali não havia lugar para isso e nem era por causa de suposto medo ou receio do Padre Adriano. Embora fosse enérgico, firme nas suas palavras, nunca destratou a nenhum de nós, meninos às vezes travessos. Suas palmas para acordar a meninada eram suaves e cadenciadas e a maneira como nos saudava no despertar para um novo dia soava, em Latim, mais alegre ainda. Mesmo hoje, mais de 60 anos depois, tenho gravado no subconsciente o som daquelas palmas e sua saudação, como também as suas feições de olhos azuis, queixo fino, cabelos bem loiros cortados em estilo militar, batina branca com cordão preto, duplo, amarrado na cintura e com pontas trabalhadas alcançando abaixo dos joelhos. Falava o português sem o mínimo sotaque e quando o discurso era longo costumava espumar um pouco no canto da boca. Nunca o vimos falar em seu idioma nativo, o holandês, nem mesmo com seu irmão de sangue, o padre Luiz. Além de diretor geral do Seminário, era nosso professor de Latim, com aquelas complicadas declinações, mas que tínhamos que dominar plenamente pois, naquele tempo essa era a língua oficial da Igreja em todos seus atos litúrgicos. Para tanto deveríamos dominar e falar fluentemente aquele idioma, já considerado língua morta..., menos para a Igreja Católica Apostólica Romana. Ainda hoje me lembro das letras em latim de alguns hinos sacros e rituais canônicos. Isto porque tendo sido coroinha até a metade dos anos 60, toda a liturgia das missas e demais atos litúrgicos eram celebrados em Latim. As missas em português só foram iniciadas algum tempo depois.

     Terminada a missa, passávamos para o refeitório ao lado. Café com leite, pão com manteiga e quase sempre queijo chedar norte-americano doado pela USAID. Às 07:00hs em ponto já estávamos em sala de aula. Seguia-se o almoço às 11:30 horas e logo depois havia o recreio na Sala de Jogos. Os estudos começavam às 13:00hs, seguindo-se o futebol às 16:00 horas e banho antes do jantar que era servido às 18:15 horas. Às 19:00h era rezado o terço, na capela, transmitido pela rádio da cidade. Antes do terço e tendo terminado o jantar, sempre havia uns 15 minutos de lazer, sob as mangueiras defronte à escadaria principal do prédio. Após o terço subíamos para a Sala de Estudos e às 21:45 hs nos recolhíamos ao dormitóro.
 

 Essa era a rotina diária com rigorosa disciplina. Durante os estudos, por exemplo, nada era permitido nem mesmo pedir algo emprestado ao colega ou se levantar da carteira. Ir ao banheiro nesse horário, só com a permissão do padre regente que, na maior parte do tempo permanecia sentado à mesa sobre um tablado de frente para todos. A ausência dele naquela mesa significava que estava transitando nos fundos e ninguém se atrevia a olhar para trás. Se o fizesse era sinal de que estava preocupado com o fiscal e o cruzar de olhos já era o bastante para intimidar o descuidado estudante seminarista. Para se levantar da carteira de estudos, a única exceção era quando havia necessidade de se abastecer a caneta. Explico! Naquele tempo usava-se somente a caneta tinteiro. Não existiam as chamadas esferográficas. Havia um cômodo no final da Sala de Estudos com uma pia de bancada de concreto bem grande. Sobre esta havia um tabuleiro, raso, cheio de areia, onde ficavam vários tinteiros (vidros com tampa de rosca) com a famosa tinta azul real lavável da marca Parker. Ali abastecíamos nossas canetas tinteiros. A minha era da marca COMPACTOR, bem macia de se escrever e não borrava. Por isso era a mais usada pelos estudantes. Era só encher a caneta, bastando bombear seu pequeno reservatório de fina, maleável e resistente borracha. Caso houvesse algum respingo, a areia o absorvia e o ambiente ficava sempre limpo. Nos cadernos, caso houvesse algum respingo descuidados, havia o mata-borrão, sempre disponível como brinde das livrarias e papelarias. Certa vez a caneta caiu e estragou a pena. Padre Luiz levou-a em uma de suas idas a Belo Horizonte e voltou novinha.  Itaúna, cidade pequena de uns 15.000 habitantes, não dispunha desses serviços de reposição ou reparos de canetas.  

 


À entrada do cômodo das tintas, havia na parede um enorme mapa do estado de Minas Gerais. Ir ali e não procurar e contemplar o nome e a localização da cidade de Lavras, quase no pé do mapa de quase dois metros de altura, era como se não tivesse passado por lá. Ver o nome da cidade natal já era um bálsamo para aquele isolamento em local tão distante e que pelas dimensões do mapa mais distante parecia. Nele estava nitidamente traçada a sinuosa ferrovia que a interligava a Itaúna. Eram mais de 500 km e a rodovia Fernão Dias sequer existia no mapa daquele ano de 1958, embora já estivesse em construção e efetivamente inaugurada dali a ano e meio.

Ao amanhecer, todos os dias, o menino seminarista contemplava o sol nascente que começava a projetar os primeiros raios de luz pela janela do dormitório no segundo andar do imponente prédio principal. Logo em seguida o Padre Adriano nos despertava. Era hora de saltar da cama, pegar a toalha de rosto, a escova de dente, calçar os chinelos e caminhar em fila para os dez ou doze lavatórios coletivos no hall logo à saída dos dormitórios. Camas arrumadas e uniformes bem trajados lá íamos, em fila, descendo as escadas para o primeiro andar onde se localizavam a capela e o refeitório, lado a lado. Nas missas gostávamos de atuar como coroinha, ajudando o celebrante. Nas missas de domingo, um pouco mais tarde e quase sempre na igreja matriz da cidade, os coroinhas atuavam em duplas. Após a missa seguia-se o café da manhã. Às sete horas já estávamos em sala de aula, no prédio anexo onde funcionava o Colégio Sant´Ana que também recebia alunos externos. Nossa classe do segundo ano ginasial era mista, quase meio a meio entre seminaristas e alunos externos. Terminadas as aulas do período da manhã seguíamos para o almoço que era servido às 11:30h e do refeitório seguíamos direto para o salão de recreio. 

 O salão de recreio do Seminário era bem amplo e havia muitos jogos. Na foto o jogo de Banco Imobiliário, em 1958. 
Foto: arquivo do Colégio Sant´Ana – Itaúna- MG

 

O refeitório era bem amplo e continha quatro fileiras de três mesas cada. Tinham pesados pés de concreto pré-moldado, tampo de granito e acomodavam seis lugares. Havia o chefe da mesa, geralmente um seminarista mais antigo, os chamados “maiores”, com 16 ou 17 anos de idade. Era o encarregado da disciplina durante as refeições. Qualquer deslize no comportamento dos meninos o chefe intervinha e depois reportava diretamente aos padres responsáveis pela disciplina geral. Estes, os diretores e demais membros do seminário e que não passavam de uns oito clérigos, ocupavam a mesa da cabeceira que ficava em posição perpendicular às demais fileiras. O chefe determinava, em forma de rodízio, quem deveria ir ao balcão da cozinha pegar as tigelas e travessas de comidas que, se necessário, eram reabastecidas. Esse balcão possuía uma pequena janela em arco, com base de granito, que servia de apoio, onde também eram depositados os pratos e talheres que eram recolhidos para as lavagens em enormes pias. Naquele tempo não havia ainda o sistema de self-service, daí o abastecimento em travessas para cada mesa. Ao final das refeições, os meninos escalados em rodízios diários recolhiam os pratos, travessas e talheres levando-os até o balcão da cozinha. Todos gostavam muito da cozinheira, Dona Fia, mulata bem forte como convém à maioria das cozinheiras, nos dedicava carinhosa atenção. Ficava alegre e estampava largo sorriso quando voltávamos com as travessas para reabastecer a mesa, como que a dizer... os meninos gostaram da comidinha que fiz.  O cardápio não variava muito e nunca faltavam carne cozida e salada como complementos.

No período da tarde, aqueles que tinham aulas seguiam para as respectivas classes e os demais para o grande salão de estudos. No final da tarde havia futebol e recreio geral e logo depois seguia-se o jantar. O futebol era o esporte preferido da meninada. Havia dois campinhos, ambos de terra batida, sem gramado e tampouco redes. Mas, mesmo assim, era o esporte mais disputado. Após o jantar, o terço e os estudos da noite, encerrava-se o dia. Na manhã seguinte repetia-se o ritual diário. No sábado era dia de se preparar a roupa suja em um saco, identificado com enormes letras pintadas a pincel. Coube ao menino a letra I que era a inicial do nome da lavadeira. Entregavam-se as roupas devidamente listadas em rol próprio e ao mesmo tempo recebiam-se as da semana anterior, lavadas, passadas, dobradas e acondicionadas no mesmo saco que levara as roupas usadas na semana anterior

 A capela do Seminário onde assistíamos à missa, às 06:00h da manhã e rezávamos o terço à 19:00h. 
Foto: 1958 - arquivo do Colégio Sant´Ana – Itaúna- MG 

       Domingo era um dia especial, pois íamos para a missa solene da Igreja Matriz da cidade. Para um dia especial, um traje especial e então vestíamos o uniforme de gala, calça e camisa brancas, cinto e sapatos pretos. Ir à cidade, uma única vez na semana, ainda que para cumprir uma obrigação, era como se fosse um passeio especial. As famílias da cidade gostavam de ver e ouvir os seminaristas cantando durante a missa. Afinal formávamos um coral de 70 vozes e a repercussão na nave da grande igreja matriz produzia um efeito especial que ressonava por todo o ambiente. À saída, as mães vinham conversar com os meninos seminaristas e carinhosamente nos abraçavam, como se filhos fôssemos. Momentos inesquecíveis, pois víamos naquelas senhoras a figura de nossa própria mãe a nos abraçar e abençoar, rogando as graças de Deus. Por isso, o domingo era um mesmo um dia muito especial, pois além de ver o movimento e as pessoas da cidade, recebíamos o carinho e a admiração daquelas amorosas senhoras. Na volta da missa íamos direto para o futebol, antes do almoço. Nesse dia havia jogos também à tarde com todos os meninos se revezando a cada meio tempo de jogo. O almoço também era especial, mais variado. Passávamos menos tempo na sala de estudos, geralmente para atividades de lazer, cuidando da coleção de selos e principalmente para escrever cartas para a família. As cartas eram infalíveis. Todas as semanas as escrevíamos e serviam como consolo, uma fuga da dolorida saudade que perpassava a alma. Mas, havia um detalhe constrangedor. As cartas eram deixadas com os envelopes abertos sobre a mesa do supervisor de plantão. Era proibido lacra-las, pois havia censura e inspeção sobre o que os meninos contavam para suas famílias. E a prova cabal disso foi que, certa vez copiei um modelo de carta para os pais e a transcrevi com ligeiras adaptações. Ora, como o tal modelo constava do livro de Português, minha carta foi motivo de sermão público por parte do Padre Adriano. Sem citar diretamente meu nome disse que cartas para os pais deveriam atender aquilo que eles queriam ou gostariam de saber e não, como alguém aqui fez, copiar um modelo do livro. Desfilou uma série de exemplos a serem contados aos pais, falando de rotinas, estudos, lazer e outros. O coleguinha Pedro, que se assentava a meu lado na sala de estudos, olhou-me e fez cara de gozação, pois eu havia lhe mostrado antes o tal modelo de carta. Esse foi o segundo de três “micos” que paguei perante os colegas naquele ano que lá permaneci. 


Como visto, a rotina diária no Seminário era extremamente rígida, controlada minuto a minuto. Não havia tempo para atividades isoladas ou momentos de intimidade, pois todas as áreas e ambientes eram coletivos, bem diferentes do ambiente familiar com quarto exclusivo. Nunca ficávamos a sós, sempre havia alguém por perto, seja um padre, professor, ou mesmo o colega tutor, monitorando cada passo, cada gesto desde o despertar até o encerrar do dia. Durante a noite lá estava o padre diretor, bem ao lado, cujo quarto era contíguo ao dormitório dos menores e se comunicava por uma pequena porta. Foi por ela que, numa noite qualquer, o Padre Luiz nos flagrou em plena guerra de travesseiros, meia hora após o toque de recolher. Tudo começou com uma sonora gargalhada lá nos fundos, na última cama, perpassando por cada um dos meninos que acompanhavam o coro da bagunça. Um não gostava, resmungava... e pronto, estava iniciada a guerra dos travesseiros que voavam como bólidos por sobre nossas cabeças. E tomem travesseiradas para lá e para cá, até que a portinhola se abriu bruscamente e o facho de luz de uma lanterna varreu as duas fileiras de camas. Correria geral, todos pularam em sua cama, mas os travesseiros atirados ficaram pelo caminho como prova cabal com as impressões digitais de cada infrator. Castigo rigoroso no dia seguinte... e lá estava o menino das Lavras, flagrado em meio à inocente bagunça. Não havia como negar e de nada adiantou correr no escuro, pular na cama e cobrir a cabeça como se estivesse em sono profundo. O padre supervisor fez questão de pegar um travesseiro a mais de 10 metros de distância e com a lanterna focou nas iniciais gravadas na fronha: PRS..... Puxou o cobertor, entregou-me o travesseiro, iluminando meu rosto com a lanterna e disse baixinho, porém firme: amanhã conversaremos... Custei a dormir naquela noite... Ainda hoje, quando brinco com meu netinho de oito anos, com travesseiradas vigorosas de ambos os lados, me pego em doce recordação daquela noite no internato e que gerou castigo no dia seguinte. Dou gargalhadas de contentamento por estar ali como a vingar o castigo recebido no Seminário e ao mesmo tempo proporcionar tanta alegria ao pequeno. Durante uma dessas constantes guerras de travesseiro, a toda hora e com olhinhos arregalados, o netinho perguntava: “Vovô..., e se a vovó ou uma das tias chegarem aqui, elas vão brigar conosco, porque bagunçamos o quarto...”. Não se preocupe, retirei os quadros ornamentais da parede e melhor de tudo..., tranquei a porta de entrada... e tome travesseirada, defenda-se ... rsrs.  Tão pouco..., para tanta felicidade da criança que vê no vovô seu cumplice na infração às regras da casa das rigorosas guardiãs da ordem, do asseio e da disciplina que proíbe essa inocente guerra de travesseiros. Mal sabia ele que ali não estava vovô adulto e sim a velha criança que um dia fora flagrada na mesma guerra de travesseiros em meio a uns vinte coleguinhas do internato. Naquele dia não havia tranca na porta e fomos flagrados e castigados, hoje, não, estamos a salvo com a porta trancada. Doce vingança, mais de meio século depois daquela malsucedida noite das travesseiradas no internato.

Assim era a rotina do internato no Seminário de Itaúna naquele ano de 1958. Rigorosa, minuto a minuto e sempre controlada pelos supervisores de disciplina. Mas, embora o menino a estranhasse nos primeiros dias, logo se adaptou às normas da casa. Hoje, distante no tempo, posso avalia-la como positiva, pois afinal, não se pode relaxar na disciplina quando se lida com turmas de quase uma centena de meninos, cheios de energia e prontos para desafiar a ordem. Obedecer às regras, ser educado, polido e respeitar a autoridade dos mais velhos ou dirigentes, são requisitos que integram a boa formação dos jovens. Acresça-se, ainda, ao rigor da disciplina ali exigida, a esmerada Educação social e religiosa e tem-se, portanto, todos os ingredientes para a formação dos jovens com ilibado caráter, controle das emoções, competências, habilidades e motivações em relação aos valores de vida. E por que agora, mais de sessenta anos depois, avaliar aquele rigor na disciplina como positivo? Simples, porque o relembro com saudade e a definição mais apropriada que vi para esse sentimento é: Saudade é o amor que fica. E ficou para sempre no meu coração a primorosa educação, a formação que ali recebi. A saudade e a dor da ausência da família foram os espinhos que todos encontramos na caminhada da vida e, embora constantes ali no internato, foram suplantados pelos benefícios recebidos. Amém e gratidão à memória dos padres holandeses, abnegados missionários que deixaram sua pátria. Verdadeiros educadores, de primeira linha e que dedicaram a vida inteira ao sacerdócio específico de formação de nossos jovens, ali entre as montanhas de ferro e manganês das Minas Gerais. O menino foi muito afortunado, pois recebeu a melhor educação possível, ministrada pelos padres holandeses do Seminário de Itaúna, dos padres alemães no Colégio Aparecida e dos missionários norte-americanos do Instituto Presbiteriano Gammon, em Lavras.

Brasília, 28 de abril de 2021

Paulo das Lavras

 

 

Notas:

 

1- A presente crônica é parte do livro: “Um Seminário na década de 1950”, composto de nove capítulos. Aqueles já publicadas neste blog têm os links indicados abaixo, conforme projeto editorial: 

  Título geral: Um Seminário na década de 1950

 Cap.I-   Uma viagem ao passado – http://contosdaslavras.blogspot.com.br/2016/07/um-     

seminario-na-decada-de-1950-parte-i.html

II- O despertar da vocaçãohttp://contosdaslavras.blogspot.com/2021/03/o-despertar-da-vocacao-sacerdotal-um.html

III- a viagem para o distante Seminário http://contosdaslavras.blogspot.com/2020/07/a-viagem-para-o-distante-seminario.html

IV- A vida no Seminário

   4.1- a rotina de um internato

   4.2- os seminaristas

   4.3- os estudos do colégio 

   4.4- A religiosidade               

   4.5- o lazer e cultura

  4.6- Eventos marcantes

         4.6.1 - Fundições e Tecelagem Itaunense 

         4.6.2- Morro do Bonfim- a capela

        4.6.3- Copa do Mundo de 1958

       4.6.4- A morte chega ao Seminário –  http://contosdaslavras.blogspot.com/2017/07/a-morte-chega-ao-seminario.html

V – A viagem de volta - O fim

            VI- O reencontro – 55 anos depois

VII- O legado 

VIII- Anexos: Curiosidades de 1958

IX- Pos-Scriptum:

                 1- Brasília: O reencontro do seminarista foragido na Basílica Metropolitana -              http://contosdaslavras.blogspot.com/2015/06/reencontro-do-seminarista-foragido.html

 

                2-  Copa de junho de 1958 – Sessenta anos da primeira Copa de Futebol 

         http://contosdaslavras.blogspot.com/2018/06/29-de-junho-de-1958-sessenta-anos-da.html

 

2- Os coleguinhas conterrâneos, Miguel e Pedro, também deixaram o Seminário, dois ou três anos depois. Matricularam-se no curso de Agronomia da UFLA e ali, em 1969, foram meus alunos. Surpreendente reencontro em sala de aula, quando o menino já era professor daquela universidade. Lamentavelmente ambos faleceram prematuramente, há pouco mais de seis anos, quando ainda estavam em pleno exercício da profissão.

 





 


 









 

domingo, 4 de abril de 2021

Aniversário e Minhas Viagens aos 76 anos

    



    Viajando, sempre! Quanta alegria, quanta satisfação com a viagem deste dia de aniversário. Foram tantas as viagens..., mais de três mil, pelo país e mundo afora em mais de 35 países. Mas, como assim? Viagens em ano de pandemia? Sim, revisitei a maioria dos locais por onde andei por mais de 50 anos. Hoje, aos 76 anos, celebro e comemoro todo esse tempo já passado. Tanto tempo que até mesmo nunca imaginei chegar tão longe, pois minha meta e meu horizonte temporal de vida eram sempre muito curtos. Não planejava sequer chegar aos 50 anos de idade, tantas foram a pelejas para sobreviver. Se ali chegasse já estaria de bom tamanho. Assim pensava, pois a história de meus parentes parecia não ajudar muito, pelo menos naqueles primeiros vinte anos. Minha mãe e sua irmã partiram jovens ainda, para sempre. Também minha irmã, Suely, se foi aos 16 anos. Perdas irreparáveis, doloridas em dobro, pois foram chamadas muito cedo. Todas elas com complicações cardíacas, num curto intervalo de apenas três anos. Com esse histórico de curtas vidas na família, achava, durante muito tempo, que também não chegaria nem aos cinquenta. Além do histórico familiar, a vida naqueles primeiros anos não tinha tido grande apreço por mim. Por cinco vezes driblei a dona morte, aquela temida senhora caricaturada com vestes pretas e uma enorme foice às costas. Por isso não tenho e nunca tive medo de falar e escrever sobre ela, embora a maioria das pessoas sequer goste de ouvir a menção desses assuntos, a nossa finitude.

Manhosa, aquela lúgubre senhora descobriu que meu coração era forte, livre dos ataques que levaram os parentes, decidiu então  procurar outros meios para despachar-me deste mundo. Ao longo do tempo, derrotada em seus planos com graves ataques à saúde respiratória do menino, um afogamento na infância e a perda total da visão de um dos olhos em acidente, partiu para outro tipo de assédio, aparentemente mais fatal. Castigou-nos com grave acidente aéreo sob violento temporal ao se tentar o pouso de um grande avião de carreira, quando então nos salvamos quase nadando em meio a um mar de combustível, o querosene, que milagrosamente não explodiu. Naquele dia ela se esqueceu de um detalhe, razão pela qual as fagulhas do impacto e arrasto da asa estraçalhada com a turbina, tanques, trem de pouso e outras peças metálicas sobre o asfalto não foram capazes de incendiar as toneladas de querosene e explodir tudo pelos ares, inclusive o menino, encharcado, ferido e sufocado, mas salvo pelos bombeiros. Quase meio metro de camadas de enxurradas apagaram totalmente as fagulhas que sequer prosperaram. Milagre e derrota para ela e o menino saiu apenas levemente ferido e encharcado de querosene. Cinco vezes, sim, por cinco vezes escapei dela... e isto sem contar outras duas vezes nas quais foi, novamente derrotada ao tentar derrubar outros aviões com o menino a bordo em viagens no exterior e que nem considerei como risco de vida.

Um acidente aéreo já seria bastante, mas por incrível que pareça em duas outras vezes a dona Vida quis nos abandonar nas alturas. Mais uma vez saímos ilesos.  Portanto, nem são cinco e sim sete vezes que lutei com a vida e driblei a aquela traiçoeira dona de capa preta e alfanje às costas. Pois bem, assim consegui chegar aos cinquenta, e já havia passado bom tempo sem novos ataques que nos colocassem em risco de vida. Respirei aliviado. Mas, ainda assim, estava sempre a perguntar, chegarei aos 60, ou 70? A dúvida sempre existiu, pois ela, a minha perseguidora estava quieta, sumida desse os 43 anos, ultimo acidente de avião. Olhei para trás, já com 70 anos, e vi, percebi o tempo de vida já decorrido, os caminhos trilhados, as dificuldades, o sucesso profissional alcançado e então dei uma sonora gargalhada, verdadeira vaia para a dona morte e exclamei: Te venci..., sete vezes, e já vivi muito mais do que esperava. Agora estou no lucro e cada dia a mais será lucro, lucro a ser celebrado a cada instante!

            Cheguei aos 70 como se disputasse uma maratona. O cronômetro e registros que usei para medir a corrida foram as minhas anotações, tipo um diário, onde tudo registrei para um dia contar aos filhos e netos o valor da perseverança. Olhar para frente, sempre e assim cheguei até agora, bem e com muita disposição para escrever e agradecer a tudo – a Vida, dom de Deus. Desde então tenho escrito crônicas que contam o passado, as passagens alegres da vida, mas sempre com a certeza de que estou no lucro, pois dela tirei e continuo a tirar muito proveito. A Vida é a nossa maior professora e quando cheguei aos setenta anos foi como se tivesse virado uma esquina. A esquina da Vida, uma virada que aos 75 anos, que ainda ontem assim contava meu tempo, mostrou-me que o menino ainda tem fôlego nessa maratona. Porém, sem esquecer que estamos mais frágeis e o ritmo deve ser mais moderado, principalmente em tempos de pandemia, quando os cuidados devem ser redobrados, pois a possibilidade da morte, que antes parecia normal, ganha agora mais força. E hoje, logo no alvorecer do Domingo de Páscoa, leio na manchete do jornal que a Vida venceu a morte na ressurreição de Cristo, e isso é uma mensagem de esperança, conforme a tradição da igreja. Outra notícia mostra a fé inquebrantável das pessoas em superar a crise dessa pandemia que nos assola e já levou mais de 320.000 vidas, somente em nosso país. Se antes eu dizia que, por sete vezes, fui assediado pela dona morte, agora então, em breve, poderei acrescentar mais uma, pois até aqui, o Senhor tem nos conduzido a salvo. Assim seja e que todos nós possamos vencer mais essa batalha que tanto sofrimento nos tem trazido.

Por outro lado, e independentemente dessa dura batalha que ora enfrentamos e que a Ciência já está iniciando a vitória com as vacinas e outras medidas sanitárias, o menino ganhou a certeza de que suas maiores batalhas da vida já foram vencidas nesse longo tempo que se passou. A agora resta olhar o passado, refletir e com alegria colher os frutos que plantou. É evidente que, se antes fazíamos planos para cinco anos à frente, agora com o avançar da idade e limitações naturais, o horizonte diminuiu. Ficamos mais tranquilos no dia a dia e pensando mais nas futuras gerações, nossos netos já crescidos nessa geração Z (nunca saberão o que é uma foto analógica, um relatório manuscrito em garranchos apressados ou gravados em fita K-7, a datilografia, etc.). Mas essa tranquilidade e suposto desinteresse em traçar metas arrojadas e longas para futuro não se aplica aos planos de escrever novas crônicas e livros, alguns já quase finalizados. E o menino os produz com gosto e prazer.

Mas, e as viagens no dia de se comemorar os 76 anos de idade? Ah..., acordei um pouco atordoado em meio a tantos pesadelos e entendi o recado. Hoje, véspera de aniversário, amanheci assim, encharcado de suor, enrolado em manta de frio (temporal ontem à noite, muito frio) e imediatamente fui meditar... é tão bom viver! Obrigado pela Vida, dom de Deus. E mais convencido fiquei ao abrir o jornal, pois parece que a maioria das pessoas, do mundo inteiro, também pensa assim. Aniversário é assim, só alegria. É o maior presente que temos para dar e receber. Amém!

Mas, ainda tenho que falar das “Viagens aos 76 anos”, afinal esse é o título da crônica. Elas afloraram em sonho nesta noite e a bem da verdade nem mais me interesso em fazê-las, pois as tenho gravadas na memória. Foram mais de 3.000 (sim, três mil), registradas em planos de voos, com anotações de identificação das aeronaves com o tipo de avião, modelo e matrícula, seus destinos, datas, reuniões e compromissos oficiais. Tudo anotado, em simples blocos de papel ou agendas de capa de couro, recheadas de notas sobre os eventos (até a pouco tempo atrás não existiam agendas eletrônicas, notebooks, tablets e muito menos ainda os smartphones com mil e uma funções, inclusive a de máquina fotográfica que, na ocasião eram verdadeiros trambolhos, com rolos de filmes em papel de 12 ou 24 e 36 poses que necessitavam de processo químico de revelação das imagens em laboratórios especializados). Reuni milhares de fotos e cartões de visitas de pessoas com as quais me relacionei nos mais de trinta países visitados. Um amigo, ao ver toda essa tralha, se espantou e chamou-me de “acumulador”. Para que isso? Desentulhe seus espaços, disse-me ele. Ora, respondi-lhe, já não bastam os familiares que reclamam do trabalhão para limpeza do ambiente? Saiba você que fui bastante previdente, pois registrei e guardei tudo em caixas e mais caixas identificadas. Sabia que em muitas dessas viagens não tive sequer tempo de apreciar as paisagens, o ambiente, a comida e que um dia tais registros serviriam para alguma coisa, além dos relatórios técnicos de viagens. E veja, hoje são minhas fontes para a escrita, histórias de vidas e lugares. Nada mais precisou ser dito e o amigo concordou e apreciou minhas coleções de moedas, a caixinha com os crachás de uma festa e ainda levou de presente um lindo porta copos verde e branco, com motivos da universidade onde trabalhei nos Estados Unidos.

Por conta desse grande acervo, ou tralhas, como dizem os implicantes, nem preciso de viagens reais, pois anotava tudo, fotografava e produzir montanhas de relatórios e artigos técnicos conceituais sobre a educação superior no Brasil e no mundo, especialmente nos EUA e França, onde permaneci por mais tempo em serviço. Toneladas de anotações e relatórios gravados em fita K-7 (alguém sabe o que é isso?) e muitos, mas muitos manuscritos..., sim manuscritos que eram o terror das exímias secretárias brasileiras e norte-americanas que passavam dias degravando ou interpretando os rabiscos apressados do jovem yuppie. O único alívio para as datilógrafas brasileiras era quando a missão tinha duração superior a quatro ou seis semanas nos EUA, pois ali havia assistentes que nos acompanhavam em viagens e reuniões nas universidades e centros de pesquisas, gravando ou anotando tudo em linguagem taquigráfica. Dia seguinte restava-nos apenas fazer a revisão dos originais já datilografados (interessante notar que os executivos norte-americanos trabalham à base de “memorandum”. Dia seguinte você recebe cópia do memorando, contendo os principais pontos e decisões tomadas na reunião. Se por acaso discordasse de algo, tinha que replicar imediatamente, senão tudo passaria a ser decisão sacramentada, tal qual ali expresso).

 

Assim, hoje, basta abrir qualquer pasta dessas “toneladas de arquivos” e minhas viagens virtuais começam sem que eu tenha de enfrentar filas, check-in em aeroportos, dirigir carros alugados, filas em hotéis, restaurantes, teatros, museus. Detalhadamente desfilam à minha vista, lindos palácios europeus, cenários de filmagens hollywoodianas monumentos e até sítios turísticos que apareciam pelo caminho. Portanto, voltar aos lugares antes visitados é maravilhoso, ainda mais quando já se tem pleno conhecimento das causas, dos objetivos e principalmente, depois de tanto tempo, dos resultados positivos daquela visita e seu trabalho. Tudo volta à mente quando abro qualquer das pastas de arquivo, seja um ingresso de museu, tickets aéreos, terrestres ou marítimos e as simples fotos feitas como ali no Smithsonian Air and Space, em Washington-DC, onde amarguei dolorida decepção por não encontrar nada sobre o nosso grande Santos Dumont, o inventor do avião. Ali só imperam os irmãos Wright como únicos inventores do avião. Decepções à parte, podemos ainda lançar mão dos recursos da internet e assim adentrar a suíte do mesmo hotel ou outro lugar, bastando olhar a antiga fatura ou cartão de visitas guardados em nossos arquivos e acessar sua home page.

 Por isso viajo muito aos 76 anos e posso garantir que, mesmo virtualmente, o prazer de se rever um local antes conhecido é duplamente prazeroso. Sempre gostei de viajar e as lembranças estão sempre presentes, até mesmo a porta de meu escritório, em casa, está decorada com motivos das viagens um dia realizadas, as quais, à época, nem imaginava que seriam repetidas eternamente e sem sair de casa em verdadeira realidade virtual. Relembrar o rosto das pessoas e agora, com as facilidades das chamadas em vídeo, conversar com elas a 1.000 ou 10.000 km de distancia e relembrar os tempos passados e trocar ideias sobre os tempos atuais..., ah isto é o mesmo que viajar para lá e reencontra-los, ultrapassando a realidade virtual e tendo a mesma sensação de ali estar, ainda que depois de tanto tempo e apenas diante de uma câmera de seu smartphone ou computador.

Assim, aos 76 anos, que agora completo, entro em meu escritório e olho centenas de livros, caixas e caixas de arquivos de fotos, documentos, suvenires, modelos de aviões (os jatos da FAB são os preferidos e estão sempre a passar por aqui, próximo à Esplanada dos Ministérios), jeeps, bandeiras e uma infinidade de arquivos digitalizados no computador e..., o que vejo tudo me agrada! Sim, vivi com intensidade e amor em meio a tudo que me veio durante tantos anos, a começar pelo trabalho profícuo no país e no exterior. Encontros com os top of minds da ciência e tecnologia, pessoas admiráveis, em todas as universidades federais do país e várias estrangeiras. Enfrentei situações adversas, incluindo pessoas não confiáveis, para se dizer o mínimo, mas,  a grande maioria foi mesmo de pessoas admiráveis e situações que nos conduziam a  resultados positivos. Enfrentei diferenças culturais, tanto no exterior como aqui e até mesmo no trato com mais de uma centena de consultores estrangeiros que aqui passavam períodos curtos e de médios prazos em consultorias técnicas. Li muito, mas muito mesmo, relatórios em idiomas outros e livros que ainda hoje abarrotam meu escritório em casa. Escrevi muito também, profissionalmente e agora, na aposentadoria algumas crônicas. Nelas estão as experiências que vivi ou convivi e dizem muito a meu respeito, o que realmente sou.

Setenta e seis anos..., apesar de fustigado por alguns percalços, quando senti por sete vezes o roçar e o bafo daquela senhora de preto, posso dizer que depois dos quarenta ela, felizmente, desistiu de me perseguir e deu-me uma trégua. Acho que além de compensar-me com o desfrute da longevidade centenária semelhante à de meu pai, vai, ainda, me esquecer por algum tempo a mais. Fiquei temeroso com a pandemia e cheguei a pensar que ela, a dona do temido alfanje, iria se aproveitar da ocasião... Que nada, a vacina está aí e vai dar um baile nesse vírus. 

Saúde! Esta foi e é a mensagem que mais tenho recebido pelo meu aniversário. Obrigado e que ela, a Saúde, seja bem vinda, para mim e todos nós. Levemos a vida com a alegria, um dia de cada vez. Ah..., mudei os planos, depois dessa pandemia que agora está sendo derrotada pela “dona vacina...”, quero chegar aos 100 e escrever muito, contando as coisas boas da vida. A cada manhã que acordo e olho pela janela a beleza do dia agradeço, com muita gratidão, a Deus pela dádiva da Vida e digo a mim mesmo que estou preparado para a próxima viagem, ainda que a data e o destino sejam desconhecidos, embora conheça o motivo, a finitude. E enquanto o meu embarque para esse voo não é anunciado, continuo a agradecer e a escrever como sempre fiz nas salas de espera ou a bordo dos aviões e hotéis, onde passei mais de dez mil horas ao longo de minha venturosa vida de executivo viajante. E hoje, aos 76 anos, adoro a minha vida de viajante virtual com relatos reais sobre ela, a Vida e os amigos que me acompanharam ao longo de tanto tempo. Revejo tudo e a todos a toda hora e por isso sou feliz nessas viagens de agora. Que venham mais dias! Saberei usar o tempo com mais pressa, mais proveito, pois ainda tenho muito a escrever, revisar e concluir aqueles mais de seiscentos títulos e respectivas anotações que me aguardam nos arquivos eletrônicos.

Adorei minha viagem, em sonhos, desta noite. Acordei, um pouco sufocado pelo calor da manta de frio, mas amei a viagem. Revivi o gostoso passado, colorido e pensei no futuro de nossos filhos e netos, enfrentando a pandemia há um ano, mas com fé e esperança, como bem mostrou o jornal de hoje. Assim é a vida!

Obrigado,       

      Saúde,

      Amém!

                                                        ... pois, aniversário é para isso: Celebrar a Vida!

 

  

Brasília, 04/05/2021

Paulo das Lavras


 
E o menino deu o primeiro drible naquela dona de vestes pretas e foice nas costas. Recuperou-se depois de nove meses de convalescência de delicada cirurgia torácica e posou para a foto aos 03 anos de idade. 
Foto: arquivos da família – maio de 1948

 

Nem mesmo os acidentes aéreos sofridos intimidaram o menino. Outra viagem cruzando o Atlântico. Mochila às costas com notebook, sacola de revistas..., bagagem despachada e lá vamos nós, viajar, viajar... e passear nos lugares onde já havia trabalhado, rever amigos e lugares. 
Bem, isto foi aos 70. Agora aos 76 não preciso mais enfrentar chek-in, filas de taxi em aeroportos, hotéis... Nada disso, basta abrir meus arquivos e destravar o gatilho do subconsciente... A Vida é isso: Só alegria, dizem os poetas e não importa a idade, pois, segundo eles, os velhos são como as crianças... 
Foto do autor


Alegria ao contemplar os souvenires na porta de meu escritório em casa, ou...

 

 ...ou ainda ver as anotações de voos, uns três mil... Mais tarde os embarques/desembarques deixaram de ser na pista. Passaram a ser em “fingers” (tuneis que interligam o avião à sala de embarque) e então tinha que pedir informações às comissárias sobre o prefixo (matrícula) e tipo da aeronave. Tudo era divertido e sempre seguido de um pedido de desculpas pelo incômodo em meio às atribuições das comissárias de bordo.


  ... locais sempre presentes na memória


...a paixão acadêmica do menino estudante, nos anos 60




 

... relembrar um jantar especial de despedida do menino, em Michigan. Um porta copo de presente para o amigo abusado que não sabia valorizar o “meu arquivo pessoal”... rsrs. Aprendeu a lição e ainda levou para casa um pedaço das tralhas


 Acordar de doces sonhos oníricos de viagens, refletir sobre o valor da vida, às vésperas de seu próprio aniversário e, encontrar notícias coincidentes com o seu pensamento, fazendo com que o menino ficasse mais alegre, mais confiante no amanhã para as futuras gerações, foi, sem dúvida um grande presente de aniversário. Correio Braziliense - Edição de 04/04/2021. Capa