segunda-feira, 7 de março de 2016

Mulher escrava... (2): ... hoje a gente só pinica na parede

     

Em 8 de março de 2015, no Dia Internacional da Mulher, discorremos sobre a “Mulher escrava”. Neste ano, extasiei-me com a entrevista de uma “escrava do machismo”, de 99 anos de idade. Sim, noventa e nove anos e 18 (dezoito) filhos. Agora desfruta a vida com toda a alegria, aqui no Distrito Federal, onde foi marmiteira, vendedora de comida nos canteiros de obra da cidade em construção. E ela ainda disse essa pérola, que me fez relembrar a infância: “.... hoje,  pinica na parede e tudo clareia, a luz liga e a água sai na pia... “. Dona Pifa (Epifânia), a entrevistada, ainda acrescentou:
            “Hoje é tudo beleza pura. No meu tempo, todo mundo era pobre, da roça. Tinha que pegar lenha no mato para cozinhar, carregar lata de água na cabeça. A gente socava mamona no pilão para fazer óleo para a lamparina”. E ainda disse mais à Revista do Correio (Correio Braziliense), de 06 de março corrente:
            “Quando era jovem, (lá pelos anos 30, do século passado), as mulheres nasciam cativas e assim morriam. Só podiam sair com o pai e, depois de casadas, dependiam dos maridos. Estavam proibidas de falar”. Até parece que ela leu os escritos do Padre Antônio Vieira que, em seus textos dos anos 1600 disse: “A mulher só deve sair de casa três vezes: no batismo, no casamento e no próprio enterro”. Mas a nossa dona Pifa, foi clara ao afirmar que “foi o ato de poder votar que tornou todas iguais. Hoje, as mulheres passam os homens. São bonitas, libertas, vão para onde querem. Eu me sinto bem de ser mulher, dou o maior valor, sabia?”, completou a dona Pifa, do alto de seus 99 anos e mais, se gaba por “não ter vergonha de nada e língua cada vez mais solta a cada ano que passa...” e finaliza: “... velho é o meu passado, e a juventude está na minha cabeça. Estou a cada ano mais alegre, sou muito feliz de viver no mundo civilizado”.

            Impressionante a vitalidade, a alegria e sabedoria dessa senhora que “nasceu escrava”. Escrava do preconceito machista que dominava a mulher, sua escrava, dependente. Veio o direito ao voto nas eleições, a frequência com maior assiduidade à escola e já no final dos anos 60 veio o grito de independência com a queima dos sutiãs em Paris, seguindo-se a superioridade numérica e de escolarização. Daí para a ocupação de seu espaço no mercado de trabalho, numa sociedade mais evoluída, foi um pulo. E nessa evolução social incluem-se, claro, as leis que as protegem contra a discriminação e garantem outros direitos. A Lei Maria da Penha foi um dos grandes avanços sociais em benefício da mulher que com esse arcabouço legal e muita disposição na conquista do mercado de trabalho. Para tanto, se qualificaram mais e em maior número que os homens, segundo estatísticas do MEC. E foi com essa superioridade que elas ocuparam espaço e se empoderaram. Portanto, hoje podemos afirmar que elas já ocupam o lugar que merecem. Adeus à dominação masculina. Dona Pifa sentiu na pele essa evolução e afirmou com gostosa e alegre gargalhada que elas, as mulheres... “... são bonitas, libertas, vão para onde querem...”. Pura verdade. Adeus mulher cativa, escrava. Doía-me o coração ver, ainda nos anos 60, as mulheres submetidas a esses rigores puramente discriminatórios.


Que bom que a Dona Pifa e todas as mulheres não têm mais que socar semente de mamona no pilão para fazer o óleo para alumiar a casa. E nem se subjugarem às severas ordens do pai ou subserviência ao marido. Assim como elas hoje só “pinicam” a parede e a luz acende e a água sai na pia, a máquina lava e seca a roupa automaticamente..., a sociedade também progrediu e a mulher se emancipou. Resquícios do machismo são tratados, hoje, com rigor pela justiça. E não tem homem que não conheça suas obrigações e quando as desrespeitam sabem que os juizes/juizas são severos nas penas. 

Mulher é para ser amada, admirada pelos seus dotes morais e grandeza interior, não importa a sua condição. O amor à mulher é completo, ou assim deveria ser para os homens. Pobre daquele que não tem (ou teve) o amor da mulher mãe, irmã, esposa, filhas, netas e amigas.  Sorte a minha, estou cercado por 1.471.498 mulheres, aqui no Distrito Federal, segundo projeções de dados do IBGE. Há que se ter sensibilidade! São elas que nos movem e hoje, mais ainda, inseridas no mercado de trabalho, já em escala considerável, temos mais essa categoria de mulheres, as colegas de trabalho. Elas sabem, como ninguém, humanizar os ambientes. Têm a delicadeza das flores e flores alegram a alma. Mulher é tudo na vida, as respeito e as venero, pois como disse a Dona Pifa “... são bonitas, libertas, vão para onde querem...”.  Uma benção dos ceus! Assim pensa o menino, de feliz infância passada nas Lavras do Funil e que, literalmente, sempre viveu cercado por elas e nelas viu, sentiu o valor que elas têm.
Que sejam felizes..., e assim nos fazem felizes também!

Brasília, 08 de março de 2016


Paulo das Lavras 

 
 Dona Pifa carregou muitas latas d’água na cabeça




 
colheu as sementes de mamona...
...socou-as  no pilão, para fazer o azeite...

... combustível da lamparina que alumiava


 
A guerreira Epifânia, a Dona Pifa, de 99 anos e muita alegria, em entrevista a um jornal.
Casou-se aos 17 anos. 18 filhos, muitos netos e três tataranetos. Pioneira de Brasília, onde
 vendia marmitas aos operários. Penou na “escravidão” feminina mas, disse ela: "hoje é só pinicar na parede
 e a luz se acende..."


 
Hoje a vida é muito boa, disse ela, na sua simplicidade: “hoje,  pinica na parede

e tudo clareia, a luz liga e a água sai na pia... “


Mulheres têm a delicadeza das flores e flores alegram a alma.
Mulher é para ser amada, admirada pelos seus dotes morais e
grandeza interior, não importa a sua condição.

Foto: Ufla- J. M. Faria