Rubem Alves, escritor, poeta, filósofo e professor
questionador da arte de educar, nos ensina que “é a saudade que torna encantadas as pessoas”, pois a saudade faz
crescer o desejo e quando o desejo cresce, preparam-se os abraços, conclui o
autor. Outra escritora, Luzineide Novais, profunda estudiosa das obras de Rubem
Alves, chegou à conclusão que ele escrevia suas histórias não somente para
crianças, mas, sobretudo para adultos. Adultos que tinham crianças morando
dentro de si e têm medo da solidão.
É fantástica essa metáfora e o autor tinha essa
característica, era hábil em valer-se delas para ensejar melhor compreensão por
parte dos leitores. Mais, ainda, ele incentivava o leitor a buscar suas
próprias experiências, sensações e/ou conhecimentos vividos ao longo da vida,
completou a autora, L.Novais, em sua obra sobre as metáforas de Rubem Alves. E
foi lendo essa recente obra (Novais, L.S. – O uso de metáforas
em estórias infantis escritas por Rubem Alves- 1ª ed. São Paulo-SP: PoloBooks,
2018. 60p.), que pude compreender que o Menino das Lavras, que
viajava até duzentos dias por ano, se enquadrava perfeitamente no perfil
descrito por Rubem Alves. Sentia uma saudade danada de casa, mas nunca havia
parado para pensar que essa saudade era exclusivamente fruto da constante
ausência da família, dos amigos, das coisas, fatos e situações vividas até
então. Não compreendia, ainda, que aquilo era o encanto do amor. Mas, aquela
danada da saudade era mesmo terrível a ponto de nocautear o menino em duas
ocasiões, de longas e demoradas viagens, levando-o a crises de ansiedade e angústias que
beiraram a depressão, em distantes terras dos E.U.A e da França. Era mesmo um adulto
que tinha crianças morando dentro de si e tinha medo da solidão dos finais de
semana, encerrados em hotéis, sem ninguém para conversar e muito menos em seu
idioma pátrio.
Mas,
de repente, eis que neste Dia dos Pais, de 2018, uma das filhas me relembra o
amor da filha menina, sua irmã gêmea, que sempre adoecia, com profundas crises
de asma, todas as vezes que o pai partia em viagens. E naquele tempo as viagens
eram para bem longe, nos E.U.A. e outros países, permanecendo por cinco ou seis
semanas em missão oficial em diversas universidades.
Segundo relatou, de repente a irmãzinha sarava, desaparecendo a crise de asma,
simplesmente porque o pai ligou naquela noite e avisou que chegaria em casa no
dia seguinte. Foi assim por várias vezes, conforme relato presenciado e confirmado
pela mãe das crianças. E com o já citado livro na mão, me deliciando com a
leitura sobre o estudo das obras de Rubem Alves, pude traçar uma analogia e
compreender claramente a conclusão da autora: “ele (Rubem Alves) escrevia suas
histórias não somente para crianças, mas, sobretudo para adultos. Adultos que
tinham crianças morando dentro de si e têm medo da solidão” e que “a saudade
torna encantadas as pessoas”.
Portanto, Rubem estava mesmo certo e L.Novais também, mas
eu acrescento..., esse jogo é de mão dupla. Não é somente o pássaro que vai,
viaja, volta e assim se torna encantado. Não somente ele se encanta, mas também
quem fica, pois o ficar também encanta na esperança da volta do ente querido. E
isto eu pude perceber neste dia dos pais, quase quarenta anos depois, com o
relato de amor da filha, contando a alegria do dia do retorno do pai, depois das
longas, demoradas e repetidas viagens (me ausentava até duzentos dias por ano). Em uma das filhas desaparecia-se, na véspera
da chegada, a crise de asma. Dia seguinte todas elas se aprontavam, se
enfeitavam com o mais bonito vestido, aboletavam-se no carro da mãe e
ansiosamente corriam para o aeroporto. E como nas metáforas de Rubem Alves, a
“ave encantada chegava emplumada, com lindas penas coloridas”, ou seja, com
presentes variados, novidades que por aqui sequer existiam. Foi essa mesma
filha que, de tanto ir dormir e sonhar com a alegria da volta do pai, cansou-se
de não o encontra-lo ao amanhecer dos finais de semana. Numa daquelas manhãs de
domingo, ao ver suas amiguinhas de cinco anos saírem a passear com o pai
perguntou-lhes aonde iriam – “ao zoológico com nosso pai”, foi a resposta, de
pronto. Foi, então, que virou-se para a mãe e disse sem titubear: “mãe, vamos
comprar um pai para nós, no supermercado?”. Essa valeu ao pássaro viajante um
mês de gaiola, sem voos e profundamente arrependido dos longos e demorados
voos, de semanas a fio.
Mas,
como conciliar tantas ausências com o sentimento frustrado dos filhos? Imaginação
da “ave viajante” não faltava para encanta-los. Certa vez exagerei, “enfeitei”
demais meu filho do coração, e prometi a ele trazer, dos E.U.A, um aviãozinho
de controle remoto, com paraquedista a bordo e que, ao simples toque de um
botão, seria ejetado e cairia de paraquedas. Ele só tinha três anos, em 1978, e
o brinquedo ainda nem existia. Hoje sim, já existe, mas nem é preciso mais,
pois nos deliciamos com as maravilhas dos drones capazes de filmar e fotografar
tudo das alturas. Mas ele não se esqueceu da promessa do paraquedista e embora
tenha se passado mais de 40 anos, ainda damos boas gargalhadas com a promessa
não cumprida pelo pai viajante, futurista e fanático por aviões.
Mas,
hoje foi um Dia dos Pais muito especial. Reunimo-nos, todos os filhos, netos e
agregados, e ainda me relembraram gostosas histórias de amor, permitindo-me
também me valer da metáfora do “Pássaro Encantado”, comprovando-se que “a
saudade, quando bem vivida, prepara o abraço na volta daquele que se ama”.
E
assim, escrevo essa crônica em homenagem a Rubem Alves, grande emérito “professor
da vida” e à amiga, escritora Luzineide Novais, por nos proporcionar esse belo
e denso estudo sobre as obras daquele mestre. Nunca havia recebido, nessas
datas dos pais, presentes tão significativos para alma. O amor é eterno e a
saudade aí está para comprovar.
Felizes
os pais que amam seus filhos e neles plantaram a semente do amor. Rubem Alves
foi o mestre dos mestres nessa arte. E por aqui, graças a Deus, a colheita tem sido farta.
Brasília, 12 de agosto
de 2018
Paulo das Lavras
]
Sarah e Pedro Henrique, sonhando com o castelo nas
montanhas e ouvindo o vovô contar as histórias
sobre os castelos “de verdade”, visitados na França, Alemanha e
Portugal.
Um avião sobre outro avião. Já na decolagem, mesmo
com a maravilhosa vista da cidade, ou até mesmo por isso, a saudade já começava
a apertar. E esse “aperto” fazia parte do milagre do
“Pássaro Encantado”, metáfora criada por Rubem Alves
para demonstrar o encanto da saudade
No aeroporto de Brasília, as filhas engalanadas na
chegada do pai (março de 1982),
de uma de suas estadas, de longas semanas, no
Panamá, Guatemala, Costa Rica e México.
Parece que o chapéu fez mais sucesso que as bonecas e outros mimos já no porta
malas, a julgar pela disputa
de quem o usaria durante a foto... rsrs.
Rubem Alves tinha razão. A saudade prepara o abraço
da chegada, a alegria do reencontro, até mesmo na disputa para posar com o
“chapéu diferente do meu pai”. Momentos inesquecíveis,
ver a ansiedade das crianças do lado de fora da sala
de desembarque, o abraço apertado, demorado, os olhinhos nas bagagens para decifrar
os presentes (as
penas bonitas, coloridas e renovadas do pássaro
encantado que viajou e voltou, conforme descreve a
metáfora de Rubem Alves),
as intermináveis
perguntas sobre a viagem..., enfim, o pássaro
viajante retornou para
o ninho da família e cumpriu-se o encanto.
... o
“pássaro encantado” gostava de voar não somente a grandes alturas e
para longas distâncias, mas, também em voos
panorâmicos em ultraleves. E não é que
aquela mesma filhota, que adoecia quando o pássaro
encantado voava para longe, e até houve pedido à mãe para “comprar um pai no
supermercado”, também passou a gostar de imitar o voo dos pássaros?
... e aquela filhota do “Pássaro Encantado”, de
tanto sonhar com os longos e
demorados voos do pai e esperar pela sua volta, superou-o... Em vez de
“comprar outro pai no supermercado”, fez melhor, alçou voos mais ousados, de parapente,
do alto da Pedra da Gávea.
O velho
“pássaro” nunca teve coragem para um voo desses, mesmo com a maravilhosa vista
das
praias
cariocas. Haja fôlego!
Mas, a alegria de ver a filha superar o pai... , ah,
isto sim, valeu a pena!
Proporcionar a presença de um famoso ator de TV,
numa festa da filha, é um mimo
que qualquer
pai gosta de presentear.
... e a menina, gêmea, abraça o pai fujão e... depois
babão, no dia do aniversário dele, em 1980
Os filhotes, com destaque para o filhão do coração, com
11 anos,
e ainda sem o aeromodelo com paraquedista ejetável...
Pausa nos voos. A passarada em férias. Parque das
Mangabeiras - BH, rumo à praia
Muitos anos depois..., com a passarada aumentada,
revisitando a
fábrica de chocolates na praia capixaba/“mineira” -
2018
Não basta ser pai ou avô... tem que participar,
entrar na alegria das crianças
Dia dos Pais - 2018
O mesmo Rubem Alves
escreveu que “As almas dos velhos e das
crianças
brincam no mesmo
tempo. As crianças ainda sabem aquilo que os velhos esqueceram e têm de
aprender de novo: que a vida é brinquedo que para nada
serve, a não ser para a alegria!”
E tem alegria maior que ser pai em dobro – pai
e avô?
Melhor ainda na
festa do Dia dos Pais/2018
A obra Luzineide Novais – 2018, analisando a arte de
Rubem Alves