domingo, 30 de agosto de 2020

Chácara e amor aos animais – alegrias e tristezas

Não fui capaz de passar, ou melhor, suportar esse fim de semana em minha chácara, embora com muito sol e sem o frio que ainda assolava a região há uns dez dias ou pouco mais.  À chegada, no entanto, até me encantei e corri a apreciar e fotografar as belezas das flores dos ipês amarelos, das acácias rosas, ambos com suas enormes árvores de mais de vinte metros de altura. Também as bugainvilles explodiam em cores, as orquídeas nos troncos de árvores à sombra nos encantavam pelo seu deslumbramento em cores multivariegadas. Mais adiante, à beira do lago o cipó rosa enfeitava a cerca viva margeando o lago, numa linha florida de trinta metros de extensão, lembrando as enormes caudas coloridas de pipas , ou papagaios como se dizia na minha terra natal, nosso brinquedo favorito nos meses de ventanias de julho até meados de agosto. Esta linda flor, o cipó rosa, foi presente de um casal amigo, de Lavras, distante quase 1.000 km, que a produziu especialmente para me presentear.  Pois bem, a beleza paisagística era tanta e o deslumbramento tal, que, simplesmente, saltei do carro, deixando a cargo do caseiro a tarefa de descarrega-lo das poucas tralhas que sempre levamos para a chácara nos finais de semana. Corri a fotografar as belezas e ainda pude assistir ao duelo de dois tucanos de bico amarelo contra vários bem-te-vis em defesa de seus ninhos com filhotes.

 

Naquele périplo da “trupe” de cães que me acompanhava, alegre e quase sempre me derrubando, notei a falta do “amigo” mais velho. Acordei daquele transe encantador em meio a tanta beleza natural das flores em perfeita harmonia paisagística e dos cães de guarda que, como sempre, pulavam ao redor, brigando entre si na disputa de quem conseguiria lamber o rosto do “amigo/pai” que acabara de chegar. “Acordei” e me dei conta de que faltava o maior e mais antigo deles, Argus. Aliás, já no portão notei sua falta, o enorme e fiel cão da raça Fila, amarelo dourado. Era o “dono” do terreiro, com seu latido forte, era sempre o primeiro da calorosa “fila de recepção” do beija-mão, ou melhor, beija-rosto, lambidas e lambidas perigosas, pois sempre havia um outro a disputar e a empurrar e a morder o concorrente. Esse era o agitado ritual e muito barulhento, ali no portão de entrada da chácara. Dizia o caseiro que ele, Argus, de apuradíssima capacidade auditiva, era o primeiro a identificar o barulho, o som característico de meu carro, alguns minutos antes e então saía em disparada para o portão de entrada, acompanhado pelos outros cães. Pelo tempo, imagino que o carro ainda estaria a uns dois quilômetros de distância. E sempre admirava aquela sua capacidade de identificar sem erro a minha chegada. Mas, também, em tom de brincadeira, eu dizia ao caseiro que, então, se eu quisesse um dia flagrar o empregado dormindo eu teria que vir em outro carro desconhecido, já que os cães denunciam a minha chegada alguns minutos antes.

 

Ao adentrar o portão, o carro nunca podia se movimentar a mais que 5 km/h e necessitava de frequentes freadas bruscas de modo a evitar-se o atropelamento de algum deles que, tangido pelos outros em disputa da primazia de se aproximar da porta do motorista, era lançado contra o veículo. Lugar, aliás, sempre ocupado pelo mais velho de casa, o bonito Argus, imponente com seus 60 kg de peso.  Pois bem, encerrei o périplo em meio aos jardins, postei algumas fotos compartilhando a alegria com meus fiéis amigos nas redes sociais e fui à procura daquele que um dia fui buscar, ainda filhotinho, num famoso canil de reprodução, distante mais de 60 km da capital, na vizinha cidade de Luziânia-GO.  Ali peguei aquele filhotinho de pelo  aveludado, amarelo dourado, patas enormes e vigorosas que já indicavam que no futuro seria um animal de grande porte. Nascido nos primeiros dias de agosto de 2011,  foi a alegria das crianças quando chegou o filhotinho de cinquenta dias. Cresceu entre outros dois outros filhotes adotados para fazerem-lhe companhia. Logo, logo, Argus  se revelou o mais forte, mais valente e constante companheiro de minhas caminhadas pela chácara. Se atravessava o cercado e me dirigia para outras áreas, como galinheiro, pomar, horta, piquetes e baias dos cavalos,  estatelava-se na porteira e ali ficava imóvel aguardando meu retorno. Às vezes adentrava essas áreas, mas não perturbava, nem mesmo ao cavalo Ciclone que vinha receber de minhas mãos um agradinho, como uma cenoura ou banana que o manga-larga marchador adorava.  Ali, na área proibida aos cães, Argus se limitava a sentar-se e olhar e nunca avançou sobre o cavalo. Ao contrário, os vira-latas quando entravam naquela área cercada com tela, justamente para separa-los, infernizavam a vida do cavalo. Argus  se portava como um gentleman, sentava e esperava o dono se afastar do cavalo. Assim se portava também ao final das tarde em quando nos despedíamos. Não acompanhava o carro e nem ia até o portão. Ficava sentado à porta da sala, triste a contemplar a partida e  como a dizer... até a próxima semana.

 

Não sei o que outras pessoas pensam, mas estou convencido de que a proximidade com a natureza, com a beleza das flores, dos cursos de águas cristalinas que formam os lagos e nutrem as plantas e mata a sede do homem, as disputas entre os cães para “agradar” o dono ou até mesmo a luta momentânea dos bem-te-vis contra tucanos e em defesa de seus filhotes, nos torna mais amorosos, afetuosos, gratos a Deus. Tornamos-nos mais genuínos em meio a tanta sensibilidade e a beleza que é estar vivo. Estar vivo em tempos de pandemia já é por si uma dádiva e estar no meio dessa Natureza é ainda mais reconfortante. A ausência do animal de estimação, para sempre, pois tive que levar Argus para os cuidados de um médico veterinário, também se insere nesse contexto da natureza e nos torna mais sensíveis. Assim é a vida, com amor acima de tudo! Argus se foi para sempre, naquela tarde de sábado, 29 de agosto, exatos nove anos depois de sua chegada. O inimigo mortal, o câncer, o levou, mesmo depois de uma cirurgia  treze meses antes. Restou-lhe esse tempo de sobrevida, com todos os cuidados e amor que merecia.  Dei-lhe um último adeus, antes que o veterinário interviesse, um afago em sua pesada cabeça que tantas vezes me empurrava como a dizer..., estou aqui! Assim é a vida e a natureza é a mais bela fonte de bem estar para nossa alma. E se naquela manhã de ontem, sábado 29 de agosto, me senti inebriado, alegre, feliz em meio às flores e pássaros ali na chácara, a tarde não foi assim, pois perdi meu fiel guardião que me proporcionou alegrias por nove anos. Mas, assim é a vida e tenho muitas outras histórias verdadeiras sobre esses amigos que a natureza nos oferece. Uma delas, inclusive, foi publicada na lendária Revista Seleções do Readers Digest e aqui a indico, juntamente com a última foto, o link do blog onde se encontra disponível para leitura.

 

Os animais representam muito na vida do homem, são companheiros na Natureza. Cuidemos deles. Amar essas criaturas de Deus nos fazem mais felizes, equilibrados, em paz com a vida e assim, também, em harmonia com o Criador podemos amar muito mais nossos familiares e amigos!

Brasília, 30 de agosto de 2020

Paulo das Lavras 


   Argus, meu vigoroso e valente guardião em todos os lugares da chácara. Ninguém se aproximava. Não gostou nem de minha filha que se aproximou da rede de descanso do guerreiro e o fotografou. Ficou bravo e pôs-se a rosnar... A filha se assustou e reclamou. Respondi-lhe..., nada de reclamar, pois o cão está cumprindo sua obrigação de guardião do rei..., e aqui sou o único a reinar, lendo meu livro...rsrs.

Agora minha rede não vai mais balançar por sobre aquele fiel guardião.

Foto - nov 2013, Argus com apenas um ano de idade



  Filhotes de mesma idade, dois meses. Argus e dois outros sem raça definida, recebidos por adoção para lhes fazerem companhia. Criados juntos, ensinam-nos os adestradores, o cão se torna mais dócil, sociável. 

Foto- out.2011


 

 Com apenas seis meses de idade, Argus já dominava o território.

 



Argus, com oito meses e  ao lado de outro Fila tigrado mais velho.



Várias raças de cães passaram pela chácara, pastor alemão, vira latas (ótimos companheiros para os Fila), boxer, pointer e outros, mas, nenhum se comparara ao vigor e fidelidade da raça Fila Brasileiro. Onde você estiver ele está junto e ninguém se aproxima, pois ele intimida e afasta quem quer que se aproxime.




 Dois Filas Brasileiros, diferentes do Argus, tigrados e um pointer no meio deles.  

Foto: abril de 2007



 Pantera a primeira da raça Fila amarelo dourado a viver na chácara

Foto: 1983



 Um boxer na chácara, ainda filhote

Foto: 2003



 Bob, o primeiro cão da chácara- 1983. Um SRD, adotado após ter sido atropelado na rua e tratado por uma colega veterinária que o presenteou à minha filha que orgulhosamente o comandava, como visto na foto. Desde então nunca mais ficamos sem uns

 três ou quatro cães na chácara.

Foto: 1983


 

Em meio às flores do jardim, ainda assisti na manhã de ontem, a batalha de dois tucanos (no alto do pinheiro), quando em retirada sob ataques dos  bem-te-vis (um dos quais aparece em baixo à esquerda da foto, no último galho) que ferozmente defenderam seus filhotinhos no ninho. 



1-     O adeus final cortando coração de quem um dia o trouxe no

colo e agora afaga sua cabeça, num último gesto antes da intervenção do veterinário.

Foto: 29/08/2020



1-     Candu- o Super dotado, vira lata de raça predominantemente Pointer, o mais inteligente que já passou pela chácara e que rendeu uma bonita história, publicada na lendária

Revista Seleções do Readers Digest (edição de abril de 2012 pag 137). Veja também e se alegre com essa bela história no blog:

 

http://contosdaslavras.blogspot.com/2014/10/candu-o-adotado-superdotado.html