sábado, 21 de setembro de 2013

Lobos, gansos e crianças. A arte de contar histórias


            Embora hoje seja o Dia da Árvore, 21 de Setembro, que prenuncia no hemisfério sul a chegada da Primavera, a estação das flores, não vamos falar sobre flores. Ou melhor, falaremos de “outras flores” mais belas ainda e que enfeitam nossas vidas, as crianças.  A Semana da Criança está próxima. Dia de presenteá-la.  Que tal um livro, um CD de histórias infantis? Contar, ouvir e ler histórias abre janelas e portas, descortina horizontes para novos mundos. Quem nunca prestou atenção nos olhinhos faiscantes de uma criança ao ouvir uma história contada pelos pais? Elas ficam na expectativa de saber o desfecho do enredo. São tomadas por uma incontida curiosidade para saber se o príncipe vai derrotar o vilão ou se a princesa será encontrada por ele. Elas são especiais e tem uma enorme capacidade de “entrar” na história e imaginar o cenário, decorrendo daí as mais surpreendentes indagações a respeito do desenrolar e desfecho do enredo. E assim são capazes, em suas fantasias, de viajarem e imaginar novos mundos. Por isso as histórias as fascinam tanto. Para as crianças a história tem ainda um valor educacional muito importante, pois além de despertar interesse e imaginação, provocam emoções nas mais diversas situações possíveis, da alegria à tristeza. E assim elas vão descobrindo o mundo real por meio de suas brincadeiras.

             Mas, em contrapartida é necessário que haja sensibilidade dos pais. É preciso ter ouvidos para escutar as freqüentes perguntas durante a história e ao mesmo tempo saber contornar situações e aproveitar a oportunidade para inserir um comentário incentivador à imaginação de modo a ampliar o mundo para elas. Contar histórias para crianças é uma arte. Sempre observo isso em relação aos netos. Ver e ouvir a mãe ou a avó pegar um livro e contar historinhas para eles é um deleite sem limites. Não tem tablet e nem filminho que os façam trocar as historinhas contadas ao vivo. Nem mesmo a euforia pela zoada dos aviões da Esquadrilha da Fumaça, em pleno show no aniversário de Brasília, foi capaz de desviar a atenção da historinha ilustrada que o vovô lia para eles, justamente sobre aqueles aviões e a Força Aérea Brasileira. Outro dia me emocionei quando uma amiga, que trabalha à noite, voltou mais cedo e encontrou a filhinha, de quatro anos, ouvindo, atenta, na cama antes de dormir, o pai a ler e contar-lhe uma historinha. Não se conteve, fotografou a cena e postou, numa rede social, toda contente com a bela surpresa até então desconhecida para ela. Mais contentes ficamos nós por compartilhar um ato tão carinhoso e que certamente torna a criança mais feliz e no futuro um adulto equilibrado, que sabe dar e receber amor na medida exata.

             Pensei que eu fosse de um tempo muito antigo quando, na escola, até encenávamos historinhas. A preferida era aquela dos caçadores com espingardas às costas, na verdade cabos de vassoura. Saíamos com garbo e valentia marchando ao redor da sala de aula, cantando estrofes à procura do lobo mau que assustava Chapeuzinho Vermelho na perigosa e temida floresta do imaginário do garoto de oito anos. Pensei que apenas a minha imaginação ainda se lembrava daqueles doces tempos infantis e que influenciaram até mesmo a vida de adulto que, certa vez, na Alemanha, fez questão de adentrar a Floresta Negra da Baviera só porque “a conhecera” na infância pelos contos dos irmãos Grimm. E aquela floresta, temida na infância, ao contrário do medo à época, lhe pareceu acolhedora e ainda mais bela justamente por evocar a memória de um passado tão feliz. Além disso, ali estava à bordo de uma reluzente e veloz Mercedes deslizando pelo circuito de Hockenheimring, a pista de corridas da Fómula1, onde nosso campeão Airton Sena brilhara tantas vezes. Nunca vi ou achei floresta mais bonita que aquela, pois a carga emocional, da infância às corridas automobilísticas, era mais que real naquele momento. Mas, voltando à questão do “tempo”, esse receio atual de parecer “antigo” é infundado. Vejo que a arte de contar história nunca se acabará.  É como o circo. Alguém é capaz de dizer que ele desaparecerá? Lógico que não, pois enquanto houver crianças existirá o circo. Da mesma forma contar e ouvir histórias, imaginar um mundo encantado, faz parte da vida do homem desde infância até o final de sua vida. Tive um amigo americano com o qual trabalhei, lá nos EUA, um grande cientista pesquisador da Georgia State University - Agricultural Experiment Station e que depois, para minha surpresa, tornou-se um escritor de contos infantis. Faleceu recentemente, vítima de insidioso mal. Após o repentino desenlace sua esposa publicou um de seus contos infantis e me presenteou com um exemplar. Sua bela historinha dos gansos migrantes integra a biblioteca mirim de nossos netinhos. Pedro Henrique, com apenas dois anos naquela ocasião, adorou as ilustrações e ouvir a tradução contada pela vovó. Ao flagrar tão linda cena, de olhinhos arregalados e atentos também eu, a exemplo da colega de trabalho já mencionada, não me contive e fotografei silenciosa e discretamente para não quebrar o encanto daquele doce e terno momento.

             Assim são as crianças e também nós, que temos o privilégio de conviver com elas, sempre seremos... eternas crianças. A vida nos retribui tudo de bom, pois o que tivemos e recebemos reverte mais tarde como bônus. Como não relembrar das gostosas histórias que o pai contava ao menino franzino de três anos, ou pouco menos, que passara nove meses no colo restabelecendo-se de delicada cirurgia torácica? Assombrações, lobisomens, lobos, onças ferozes, coelhos espertos na mata, sapo que entra na viola do urubu e vai de carona à festa no céu e ao ser flagrado na volta ainda engana a raivosa ave que, lograda, o atira na água e não na pedra? Ah... histórias contadas pelos pais nos tornam, sim, mais felizes, mais sensíveis, pelo menos o bastante para entender, valorizar e repetir isso às crianças de hoje. Ah... quisera eu, ser como Monteiro Lobato, o contador de histórias infantis e que desejava fazer um livro onde as crianças pudessem morar. Talvez devêssemos atualizar e dizer “fazer um site” para elas acessarem e... “curtir/comentar/compartilhar”. Seria um sucesso neste mundo digital de hoje, com certeza!

            Que elas, as crianças, sejam felizes não só nesse dia dedicado a elas, mas, sempre! Criança feliz, adulto feliz! Assim, construiremos um mundo melhor.

            Parabéns a elas e aos pais, tios, avós, professores e todos que cuidam para que elas sejam felizes.

 
Brasília, 21 de setembro de 2013

 
Paulo das Lavras 

Pedro Henrique, aos dois anos ouvindo a historinha
"O vovô e o Ganso", do amigo Charles Laughlin
 
 
 
                                   Sarah e Pedro Henrique, atentos à história da Força
                                         Aérea, durante show da Esquadrilha da Fumaça                   
 

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