quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Lar, escrínio da vida..., assombrações e lobisomens

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(em construção... aguarde)


Lar, escrínio da vida..., assombrações e lobisomens

 

O melhor da viagem é a volta para casa, diz o adágio. Desde a origem da humanidade o lar sempre foi o lugar onde se busca o refúgio, o conforto físico e da alma. Viagens são ótimas para o descanso, mas, depois de alguns dias, sempre lidando com estranhos em aviões, taxis, hotéis, restaurantes e locais de lazer, entretenimento e cultura, a gente para e pensa..., quero voltar para a casa, quero desligar os sentidos em alerta para com ambientes estranhos. Quero paz, relaxar no meu bunker.  Ali, na sua casa, se escondem e repousam todas as memórias da vida, no cofre da alma, nos escaninhos da mente, no subconsciente de nossa memória, nosso baú de afetos. É no aconchego do lar que encontramos a paz a tranquilidade, o relaxamento da alma que se torna mais receptiva, mais amorosa e livre dos freios sociais a que normalmente nos impomos em sociedade. Quem não se lembra das noites mal iluminadas na fazenda, reunidos na cozinha do fogão a lenha que, além de aquecer o ambiente, soltava crepitantes fagulhas e labaredas que iluminavam o ambiente? Ali, à roda dos pais, tios, avós ou convidados (como se visitavam entre si, os vizinhos e parentes! Estes, às vezes vinham de locais um pouco mais distantes ficavam para o pouso, para alegria das crianças e iam-se no dia seguinte).

Doces lembranças à roda do fogão à lenha nas noites frias de inverno do sul de Minas. Ouviam-se histórias de fadas a assombrações e lobisomens, saboreando pipoca, broas de milho, pamonhas e biscoitos de polvilho (bolinhos de chuva, fritos, só no café da tarde) e uma boa caneca de leite quente. Estas, as histórias de assombrações e lobisomens tinham um papel educativo, preventivo e fundamental. Tais terrores, os pavores das crianças, habitavam justamente as matas, rios e lagoas. Mas por que somente naqueles locais? Simples, pois as crianças gozavam de inteira liberdade de ir e vir por todo o território da fazenda. Nada as impediam de explorar os ambientes. E aí morava o perigo, pois, num piscar de olhos as curiosas crianças poderiam embrenhar-se mata adentro, entrar nas lagoas e rios traiçoeiros. Perigo constante e a única maneira de detê-las era a invenção dos fantasmas, lobisomens e todo tipo de bicho-papão que, convenientemente, só habitavam aqueles perigosos lugares, especialmente à noite quando saíam em busca de comida.

Nesse clima de terror constante, nunca uma criança ousou pisar aqueles locais sozinha, principalmente à noite. E as noites de antigamente eram o momento de reunião da família, pois lá fora estava escuro e os “bichos” estavam à solta, enquanto que nas cidades as narrativas que aterrorizavam as crianças eram a do homem doido, o homem do saco que pegava e raptava os pequenos.  A esse confinamento, no lar, os antigos chamavam de escrínio da vida, o refúgio, a fortaleza, aonde a alma relaxa e ficamos protegidos dos “bichos” que rondam nossa vida. Segundo a psicologia, para as crianças a casa era inexpugnável, pois ali estavam seus guardiães, o pai e a mãe. E esse “conceito” nos acompanha a vida inteira.

Foi assim com o menino, medroso das matas, rios e lagoas. Neles só entrava acompanhado de adultos. Não raras vezes a noite o surpreendia nas humildes casas dos camaradas (empregado rurais, residente na fazenda). Voltar para a casa, vencer os 100 ou 200 metros de distância, no escuro? Ah, nem pensar em atravessar a pequena matinha e o córrego que passava pela mangueira de criação de suínos. Ali estavam os dois maiores terrores das crianças das fazendas. A mata e cursos d´água onde havia além de cobras, lontras, jacarés, escondiam os lobisomens e outros fantasmas à espera de incautas crianças. Caiu a noite e não havia outra alternativa a não ser as costas do camarada  Vitor Coelho. Ao chegar à matinha que, obrigatoriamente, tinha que ser atravessada, agarrávamos às suas costas com tal intensidade que até parecia um  filhote de mico atarracado à mãe, pulando de galho em galho naquele veloz balé na copa das árvores e que tanto admirávamos, pois, para nós, as crianças, pareciam um único bicho com duas ou mais cabeças. Colocávamos toda a força que um menino de seis anos poderia ter, apertando os braços ao redor do pescoço do “Vito” a ponto de quase sufocá-lo. Isto provocava-lhe reclamações que soavam mais ameaçadoras (como eram cruéis os adultos na educação das crianças do anos de 1950): se você continuar me enforcando vou te largar aqui na mata.... Paradoxalmente, apertávamos ainda mais o pescoço do pobre Vito, rapaz de uns 20 anos que nas horas de folga era o nosso companheiro, juntamente com seu irmão Tião Coelho, nas brincadeiras infantis, cavalgadas, natação nos ribeirões e lagoas e, principalmente, na fabricação de brinquedos próprios como balanços (gangorras) em árvores e até mesmo a construção mini-rodas d’água que movimentavam moinhos criados por nós mesmos, movimentados por polias e correias de embira de bananeira. Quanta criatividade, pura e simples engenhosidade.

 

Pois bem, todo esse preâmbulo foi apenas para se situar uma questão hoje enfrentada em todo o país, a quarentena social imposta pela pandemia do coronavírus. Assim como a escuridão de antigamente proporcionava momentos de reunião no aconchego do lar, hoje, o apagão das cidades provocado pelo coronavírus está exercendo o mesmo papel: fazer-nos voltar para o escrínio da vida, a casa, o lar, refúgio, fortaleza para a nossa alma.  Que essa quarentena em casa nos sirva para a reflexão sobre a corrida e egoísta vida que temos levado. Que aquela escuridão das noites de antigamente, que nos levava a nos reunir em torno dos mais velhos em busca das histórias e do saber, tenha hoje o mesmo papel, a mesma função social, pois o coronavírus ao levar-nos para o isolamento, recolhidos em casa, pode funcional como um farol, servindo de luz para o nosso aprimoramento.

 

Brasília, 22 de março de 2020

Paulo das Lavras.


 
Minha roda d´água que, na infância, chamávamos de moinho, construída  na chácara, 
como a relembrar a infância na fazenda



domingo, 28 de janeiro de 2024

Lavoisier, Salgado e o menino de corte de cabelo da moda

 

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Foi por volta do ano de 1774 que o cientista químico, francês, Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794), com apenas 30 anos de idade, descobriu uma das mais famosas e naturais leis da Química: “Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. E todos nós que estudamos química, desde o primeiro ano do curso de 2º grau, nunca mais nos esquecemos disso. A decomposição de uma matéria tem a mesma quantidade de massa do produto original, ou seja, ainda que a matéria se decomponha em dois ou mais produtos, a soma de suas massas será sempre igual ao peso da massa  inicial. É a chamada Lei da Conservação da Natureza. Vai daí que se criou o ditado popular que diz; “Na vida nada se cria, tudo se copia...”, em clara alusão à preguiça mental de se criar algo novo, seja um invento, ou mesmo uma atualização ou modernização de qualquer coisa. É a nossa lei da inércia, do menor esforço possível (e é natural isto), pois estamos sempre a preferir a repetição das coisas do passado. Foi assim nesta semana. Descobri, casualmente, algo interessante no mundo da moda.

O amigo Rogério Salgado, artista no campo da fotografia, dedicou-se a recuperar uma foto do menino com sua turma de internato no Seminário. Garoto de apenas 12 anos, ali estava fazendo pose com alguns coleguinhas, diante de aparelhos de ginástica ao lado do campinho de futebol. Provavelmente numa manhã de domingo, pois ainda trajava jaqueta de cor caqui acinzentada, uniforme usado para a missa de domingo na catedral de Sant´Ana, da cidade de Itaúna-MG, onde os pequenos seminaristas cantavam hinos sacros em coro de 70 vozes. O coral atraía grande número de frequentadores e após a missa era comum as  mães amorosas nos abordarem à saída e nos abraçar carinhosamente, elogiando nossa performance no lindo coral ensaiado durante a semana inteira. Muitos de nós, meninos que nunca havíamos saído de casa, ansiávamos por aquele abraço, único carinho ali muito distante da família. Pois bem, ao recuperar e colorizar a foto, o amigo fotógrafo mostrou as feições do garoto que parecia forçar um sorriso, mas que a tristeza, a melancolia da solidão, da saudade da família, não permitia, não destravava o semblante. Mas, ainda assim, além dessas evidências,  a foto mostrou nitidamente o estilo de corte de cabelo predominante naqueles idos de 1958, ou seja, exatos 66 (sessenta e seis) anos atrás. Surpresa maior aconteceu ao receber, dia seguinte à chegada da foto restaurada, a visita de familiares e entre eles o neto de 15 anos com um corte de cabelo semelhante a aquele de tanto tempo atrás. Todos comentaram a semelhança da moda “atual” entre os jovens, com aquele menino de 12 anos, com o corte de cabelo de 66 anos antes e ambos, neto e avô, ficamos muito felizes com as semelhanças e ainda orgulhoso retruquei a todos que  ninguém mais poderá me achar velho, demodê...

É por isso que digo, a Lei de Lavoisier, de 250 anos atrás, sempre funciona para tudo, até mesmo para a moda. Modelos vão e voltam. Só não sei onde surgiu esse “atual”  hair-style que meu neto tanto gosta e disse-me que  99% de seus amigos o adotaram. A foto restaurada pelo amigo Rogério Salgado fez sucesso. Obrigado! Me senti novamente um jovem de 12 anos, que estava em dia com a moda... O mesmo ..., só os seus cabelos mudaram, diriam na propaganda do shampoo... rsrs

 

Brasília, 28 de janeiro de 2024

Paulo das Lavras 

 

 Um corte de cabelo do ano de 1958 ...                                                     

 



        
... que se repete nos jovens em 2024


 Foto original de 1958 e o trabalho de recuperação/colorização