Luto... Brasília amanheceu triste. Seus
canteiros de flores choram. Ozanan Coelho, o agrônomo que transformou,
literalmente, a cidade num canteiro florido, partiu repentinamente. Foram 40
anos de trabalho, transformando a capital numa cidade-parque que encanta a
todos os seus três milhões de habitantes e inúmeros visitantes. Sem igual no
mundo inteiro! Deixou sua marca indelével em nossos corações, a beleza da
cidade em flor, que tanto tenho cantado e exaltado em crônicas. Ozanan, pessoa
simples e embora diretor-geral da Novacap, trabalhava com a porta aberta, como
ele própria dizia. Entra quem quiser, recebo a todos igualmente e o máximo que
pode levar é um não... , completava ele. Lembro-me dele desde o ano de 1980,
quando solicitei-lhe, em seu gabinete e gentilmente concedeu um estágio para
paisagista da UFLA. Também deixou lembranças como incentivador da criação de
jardins em todas as casas, produzindo e fornecendo mudas a preços acessíveis. Brasília é hoje exemplo de
consciência ambiental, paisagística. Aqui, os jardins são os únicos patrimônios
totalmente livres, sem nenhum cercamento ou policiamento e ainda assim plenamente
respeitados. Nunca houve um único caso sequer de vandalismo contra as flores e
jardins. Todos os admiram.
O poeta
Rubem Alves aponta pelo menos uma razão para se gostar de jardins: “Um jardim é
a face visível de Deus, é o
seu rosto sorridente…”. E num jardim estou no paraíso, completa o autor.
Plagiando a metáfora do poeta, podemos afirmar que, em Brasília, vivemos num
paraíso, cercado de flores em seus milhares de canteiros e mais quatro milhões
de árvores, a maioria floríferas exuberantes, além de outros tantos milhões de
metros quadrados de gramados. As flores enfeitam a alma. Não é a toa que o altar das celebrações
religiosas é enfeitado com flores, pois alegram mais ainda a alma e ajudam a
nos aproximar de Deus. Da mesma forma enfeitamos a nossa casa, a mesa da festa,
qualquer que seja. Até na morte enfeitamos a viagem para a última morada dos
entes queridos, como que a alegrar-nos, sabendo que estamos retribuindo o amor
que deles recebemos em vida.
Tenho certeza que o mestre jardineiro, Ozanan Coelho, terá
hoje o seu féretro enfeitado em alameda florida, pois em vida ele pavimentou
muito bem o seu caminho. Estarei lá para levar ao amigo e respeitado profissional, o
último tributo de gratidão. Enfeitou toda a cidade, por longo tempo. Que Deus o
receba com flores, da alma, pois as flores do campo nós lhe oferecemos hoje, nessa
despedida para a morada final. Ainda que essas flores que levaremos tenham sido plantadas e
cultivadas por ele, no campo ou ainda inspirando, diariamente, nossa alma que
aprecia e reverencia a beleza dos jardins. Por isso lhe retribuímos com
gratidão. Pena que hoje, ao pegar uma flor para levar à sua despedida, nos
invade um sentimento de profundo pesar, pelo passamento daquele que viveu entre
elas. Como Ruben Alves, ele também será eternamente conhecido e reconhecido como o homem que enfeitou Brasília, amava as flores!
Brasília, 9 de maio de 2016
Paulo das Lavras
A
Congea tomentosa, em grande e exuberante volume, em minha
chácara.
Inspirada nos jardins do Centro de Convenções Ulisses
Guimarães, da década de 1990
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