Brasília
amanheceu, hoje, triste, muito triste, de luto, com a notícia do passamento de Carlos
Murilo Felício dos Santos, um dos pioneiros da construção de Brasília. Faleceu,
de causas naturais decorrentes de pneumonia, a dois dias de completar 94 anos
de idade. Acompanhou o ex-presidente Juscelino Kubistchek desde antes de ser
governador de Minas Gerais (1950/59) e a partir de então nunca mais o deixou,
ocupando as funções de secretário particular do mais querido governador e
presidente que o Brasil já teve. Também foi deputado estadual e federal e nessa
condição, de político e secretário particular de JK, mantinha vasto arquivo da história
do período em que foi protagonista. Tinha uma memória prodigiosa e era capaz de
passar horas contando inúmeros casos da vida politica mineira e nacional. Foi
assim que o conheci, em junho de 2012, na cerimônia de lançamento de seu livro “JK,
Momentos decisivos contra o golpismo no Brasil”. O mais polido, culto,
simpático e amável homem público que já conheci.
Quando
me apresentei a ele, naquela cerimônia, ao dizer-lhe o nome de minha cidade
natal, foi como se tivesse lhe destravado uma palavra-senha que abriu-lhe a
memória. Relembrou-me que lá esteve por várias vezes e a primeiro detalhe revelado
foi: Lavras, terra das moças mais bonitas de Minas Gerais... A partir daí, parecia que já éramos velhos
conhecidos, pois deixou os demais convivas e levou-me para um canto e
gostosamente desfiou casos e casos da época. Não me surpreendi, pois ele tinha
sido o companheiro do “pé-de-valsa” JK. E quem acompanhava o mais que simpático
e carismático presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira tinha mesmo que ser
assim, alegre, simpático. Foi logo falando de suas visitas à Lavras, a começar
pelas campanhas eleitorais do candidato a governador de Minas Gerais. Depois,
voltaram para inaugurar uma grande e importante usina hidrelétrica na região
(Itutinga - 1955). Ainda falou do famoso Baile do Século, em comemoração ao
centenário de Lavras, sempre recepcionado pelo amigo e correligionário de Jk,
Dr Sílvio Menicucci, que foi prefeito em outras ocasiões e depois deputado estadual.
Ótimas lembranças, tinha o autor do livro, Carlos Murilo, sobre a cidade natal
do menino e passamos um bom tempo a recorda-las. Foi assim que, então disparei
o convite: “... o senhor vai voltar a Lavras, tem que rever a cidade e os
amigos e dentre os quais, agora, sou o primeiro a lhe convidar. Vamos fazer lá,
também, o lançamento de seu livro na terra que tão bem os acolheu. Esperamos
que o senhor nos conceda essa honra, de receber dois grandes amigos da cidade,
o senhor e também JK (in memoriam) aqui reverenciado em seu livro”. Não
titubeou e esboçou um largo sorriso de aceitação do convite.
Contatamos
a Secretaria de Cultura e a Universidade Federal de Lavras que prontamente
encamparam o convite e patrocinaram a cerimônia de lançamento do livro de
Carlos Murilo, o amigo de Lavras que escreveu sobre outro amigo, JK. Assim,
realizou-se em 30 de agosto de 2013, na belíssima Casa Rosada, a cerimônia de
lançamento do livro JK, à qual compareceram o Vice Prefeito, Aristides Silva Filho,
o Presidente da Câmara Municipal, Marcos Possato, o Reitor da UFLA, Prof
Scolforo e outras autoridades, além da esposa do escritor, Srª Déa Lúcia
Pimenta Felício dos Santos e também o filho e secretário, Beto Felício. Foi uma
grande honra receber o Dr Carlos Murilo e sua família na cidade de Lavras, que ele
e JK tanto amaram. Certamente a cidade e sua gente, os políticos de então
(especialmente as lindas moças) os marcaram também, pois mesmo depois de quase
cinquenta anos de sua última visita à cidade, ainda se lembrava de detalhes.
Sentimo-nos honrados com sua presença, um ano depois, para o lançamento de seu
livro de memórias de JK, evento que também serviu para reforçar os laços de
amizade e admiração por tão ilustre memorialista da história de Minas e do Brasil.
E
hoje, surpreendidos pela infausta notícia de seu passamento. Grande perda!
Nosso abraço de pesar aos familiares desse grande homem, íntegro e que só
queria o bem de todos, como bem disse a reportagem de hoje do jornal Correio Braziliense.
Foi, ainda, um dos grandes batalhadores pela construção de Brasília e ajudou JK
a vencer os obstáculos da política. Sou duplamente grato a ele, por Lavras,
minha terra natal, onde pude receber a ele e sua família e, ainda, por Brasília
onde resido há quase meio século. Sim, Brasília está de luto, o Brasil também.
Brasília,
12/01/2021
Autografando
seu livro
O convite da
Ufla
Anexo:
Palavras do Menino das Lavras no
lançamento do livro de Carlos Murilo:
Amigos,
“JK só sonhou o que sonhou, viveu o que
viveu, construiu o que construiu e sofreu o que sofreu, porque ousou se
levantar contra as forças que sempre conspiraram contra a democracia, o
desenvolvimento nacional, a progressão do nosso povo e o fortalecimento da
nossa nação diante das outras nações do mundo.
A melhor forma de
combate-las - já que elas estão aí, vivas e atuantes - é não esquecer o
passado. Um povo que não conhece sua história não pode construir seu futuro”.
Com essas palavras o Dr.
Carlos Murilo Felício dos Santos, que temos a honra de receber, nesta noite,
sintetiza tudo aquilo que foi em vida o nosso eterno Presidente Juscelino
Kubitscheck de Oliveira. Daí, a escolha mais que acertada para o título dessa
grandiosa obra: Momentos Decisivos- JK
contra o golpismo no Brasil. Nesta obra o Dr. Carlos Murilo nos revela e
que nos revela fatos inéditos.
Exmo Sr....
........ ........
Senhoras e Senhores...,
Nosso convidado
especial...., Dr. Carlos Murilo Felício dos Santos e digníssimos familiares,
Dona Déa, esposa, e Beto Felício , filho e Secretário Particular
A sua presença,
Dr. Carlos Murilo, nesta
cidade de Lavras, com mais de 300 anos de história que vem desde os primórdios
das minerações auríferas nas terras das Minas Gerais, para aqui lançar a sua
obra nesta Feira do Livro e das Letras de Lavras, como parte integrante das
comemorações dos 105 anos de existência da Universidade Federal de Lavras, em copatrocínio com a Secretaria Municipal de Cultura, muito nos honra. Primeiramente pela sua primorosa e
esmerada produção histórica sobre a vida do ex-presidente JK, amplamente
elogiada pela crítica. Em segundo lugar pelos laços históricos e afetivos
que unem a cidade de Lavras ao autor e também ao personagem central do livro em
questão.
Dr. Carlos Murilo foi Deputado Federal e
Secretário Particular de JK desde os primeiros dias de seu governo do estado de
Minas Gerais (1951/55) e depois na Presidência da Republica, de 1956 a 1960.
Estiveram, ele e Jk, várias vezes em Lavras, destacando-se dois grandes e
marcantes eventos: a inauguração da nova iluminação elétrica da cidade, em
1954/55, após o início de funcionamento da Usina Hidrelétrica de Itutinga, por
ele construída e depois, em outro evento também importante, em 1968, o Baile do
Século, nas comemorações do centenário de elevação da Vila de Lavras do Funil à
condição de cidade. Além disso, o autor do livro e o personagem retratado,
sempre mantiveram laços de amizade e cooperação com políticos da cidade em
benefício de toda a comunidade.
Não
bastasse isso o Dr. Carlos Murilo presenciou e participou, diretamente, de
alguns episódios mais importantes da história do Brasil no século XX ao
conviver intimamente com JK, como primo, amigo e conselheiro, e acompanhou os
desafios enfrentados por Nonô, na intimidade.
Seu livro
retrata a fibra do homem público, JK, e seus grandes feitos em prol da
democracia em nosso país. Uma verdadeira lição de estadista, corajoso, determinado e
que todos temos muito a orgulhar. Assim, a presença do Dr Carlos Murilo Felício
dos Santos, um dos últimos protagonistas daquela epopeia, será uma oportunidade
ímpar para o meio cultural da cidade ouvir e reviver esse grande período da
história local, regional e nacional.
Jk
foi um homem destemido, corajoso, além de seu tempo. Deu mostras disso quando oficiais
da Marinha o emparedaram ameaçando publicar um manifesto questionando seu governo.
O então ministro da Marinha, portador do recado provocador da oficialidade
daquela pasta, teve de retornar às pressas à sede de seu Ministério e
transmitir a reação de JK que dizia:
“Deus poupou-me do
sentimento de medo. Senhor Ministro, diga a seus oficiais que estão reunidos
que eles têm cinco horas para rasgar esse documento e sair do prédio, sem
divulga-lo, ou eu vou mandar cercar o prédio e prender todos que o tiverem
assinado”,
conforme relatado à pagina 101 deste livro de
Memórias, duas depois saíram de mansinho, embora tivessem pensado que “JK estava
perdido” e não lhe restaria outro caminho igual ao de Getúlio Vargas ou a
renuncia na melhor das hipóteses.
Além
de sua coragem e destemor, Jk foi, antes de tudo, um idealista que inspirou,
instou, encorajou e deu novos horizontes ao brasileiro. Nelson Rodrigues,
mordaz escritor e cronista, assim também o reconheceu em sua crônica “O Brasil
em Marcha”. Disse o cronista:
“Amigos, o que importa
é o que Juscelino fez do homem brasileiro. Deu-lhe uma nova e violenta dimensão
interior. Sacudiu, dentro de nós, insuspeitadas potencialidades. A partir de
Juscelino, surge um novo brasileiro. Aí é que está o importante, o eterno na
obra do ex-presidente. Ele potencializou o homem do Brasil.”
Dr.
Carlos Murilo muito bem interpretou isso ao publicar esse Livro e mais...,
antes foi um batalhador na árdua luta pela construção do Memorial JK. Na época tiveram dificuldades enormes, até mesmo para
a aquisição de um terreno onde se pudesse construí-lo. Ao saberem a que se
destinava o terreno, imediatamente o vendedor desistia do negócio, tal era o
medo naqueles tempos de repressão e bombas no Riocentro e atentados à OAB.
Felizmente um amigo cantor muito popular, Silvio Caldas, abordou o presidente
Figueiredo e este, surpreendentemente, encampou a ideia, chamou Dona Sara ao
Palácio Alvorada e mandou que ela escolhesse o local. Ali, no ponto mais
elevado, onde Jk mandou celebrar a primeira missa, construiu-se o Memorial.
Porém..., relata Carlos Murilo:
“tivemos
que enfrentar outra batalha para a colocação da estátua de JK”.
Uma minoria de direita radical
dos militares se opôs ao içamento da estátua que hoje lá está. Por três vezes,
sim, por três vezes a estátua subiu e teve que ser retirada por ordem de um
mandante ou comandante encastelado no Forte Apache, sede do QG do Exército,
situado a poucos metros à frente do Memorial. Na 4ª vez ela subiu e não desceu
mais, depois que o Presidente ligou, pessoalmente, para o tal comandante e
ordenou:
“Olha, amanhã, a
estátua sobe, sem falta. E ninguém mais tira”.
Dr.
Carlos Murilo foi protagonista de todas essas batalhas que à época a imprensa
nem se atrevia a noticiar. Lembro-me que o jornal Correio Braziliense noticiou,
timidamente, em notinhas de pé de pagina, numa das vezes que a estátua subiu e
desceu, algo assim:
“a
estátua de JK foi içada e menos de 24 horas depois foi retirada. Parece que
forças invisíveis do QG do Exército não a sustentaram.”
Foi
preciso muita garra e coragem desses bravos admiradores e defensores do
eminente e saudoso JK, até mesmo depois de sua morte. Imaginem antes, enquanto vivo,
quanto “perigo” representava a esses radicais de direita. Nenhum outro homem
público era tão ameaçador à ditadura quanto JK. Seria sempre o querido do povo,
um bem sucedido e natural candidato à Presidência da República e enquanto isso
a Operação Condor cuidava de eliminar as principais lideranças politicas
adversárias da ditadura instalada no país.
O livro
traz, ainda, revelações inéditas. Por que a perseguição
constante contra JK? Desde sua posse até sua morte? Pela primeira vez, um dos
membros da família JK revela fatos envolvendo a vida e as circunstâncias de sua
morte num acidente de carro na rodovia Dutra, a caminho do Rio de Janeiro,
depois de uma estranha parada em um hotel à beira da estrada. Ali conversou
durante 90 minutos, a sós, com um personagem não identificado. Logo em seguida,
a pouco mais de um quilômetro da saída do hotel, o acidente fatal. E o
fragmento de metal na cabeça do motorista? A farsa da batida no ônibus? São
perguntas que o inquérito fajuto não considerou. Dr. Carlos Murilo conta a sua
versão de atentado contra a vida de JK baseada em fatos que ele poresenciara
dias antes, ainda em Brasília, antes daquela viagem fatídica.
E a despedida a Jk foi a mais comovente manifestação civica já vista em
Brasília. Foi uma demonstração de amor ao fundador da cidade. Dr Carlos Murilo
conta que o povo arrebatou das mãos dos Bombeiros a urna com o corpo de JK,
gritando:
o povo leva... deixa que o
povo leva...., o povo vai levar...
E assim foi,
num trajeto que durou mais de seis horas, quando não deveria levar mais que
meia hora. O povo cantando desde o Hino Nacional às canções como “Amanhã vai
ser outro dia”, de Chico Buarque e “Para dizer que não falei de flores”, de Geraldo
Vandré. Nas janelas dos prédios, lenços e panos brancos sendo agitados....
.....E aqui,
Dr Carlos Murilo, abro um parêntesis em seu relato para dizer que, também eu e
minha família, estávamos na janela do 2º andar de nosso amplo apartamento
vazado na Superquadra 308 Sul, cujos fundos dava para a Avenida W3 onde passou
o féretro por volta da 21 horas. O Senhor, no entanto, não contou em seu livro
que aqueles lenços e toalhas brancas que acenávamos das janelas, serviam também
para enxugar as lágrimas que derramávamos diante daquele cortejo que levava o
corpo do nosso querido e eterno Presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira.
Aquele mesmo que, exatamente a um ano atrás, cumprimentara a mim e a meu irmão
quando de seu desembarque no aeroporto de Brasília. Estava absolutamente só,
sem segurança ou sequer algum acompanhante. Ali estávamos à espera de minha
família que desembarcaria minutos depois para fixar residencia definitiva na
capital. Ainda me lembro que, um tanto surpreso com a inesperada saudação que nos dirigiu, ainda
tive tempo de dizer-lhe: Aí , Presidente, veio visitar sua filha ..., Brasília.
Obrigado por nos ter dado essa bela cidade. E ele, já próximo ao veículo que o
aguardava, virou-se, deu um largo sorriso, agradeceu, acenou e embarcou no
carro que arrancou apressadamente. Agora, ali estava ele, de novo, passando em
frente a nós, carregado nos braços do povo em direção à sua última morada.
Usamos sim, Dr Carlos Murilo e meus amigos, aqueles lenços brancos que o Sr
viu. Além de acená-los serviram para enxugar as nossas doloridas lágrimas.
Finalizando...., Dr.
Carlos Murilo e meus amigos...
Se Jk foi em vida
aquele que obstinadamente lutou contra as forças que sempre conspiraram contra
a democracia, o desenvolvimento nacional, o progresso do nosso povo e o
fortalecimento da nossa nação..., temos aqui, hoje, um continuador dessa luta,
pois vemos no livro que ora recebemos, que Jk não lutou em vão. Ele nos deixou
um legado indelével e o, senhor, Dr. Carlos Murilo, com essa primorosa obra de resgate
dessa memória, é, sem dúvida, um continuador dessa luta e assim se insere, definitivamente,
na história deste País como um dos principais protagonistas da era JK, ...... parceiro,
companheiro desde a primeira hora. Amigo leal que soube retratar com
fidedignidade os....
Momentos
Decisivos de JK contra o golpismo no
Brasil
E, assim, o senhor
também faz história.
Parabéns e muito obrigado, por sua obra e ...
sobretudo pela sua presença, juntamente com a digníssima família, aqui nesta
Casa que os acolhe com muito carinho e gratidão!
Lavras, 30 de agosto de
2013
Paulo das Lavras
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