Li
um artigo interessante sobre a terapia psicológica por meio da escrita, sejam
poesias, contos, crônicas ou outras. Foi
lembrado o exemplo de Carlos Drummond de Andrade que, em entrevista, citou o
inicio de sua carreira na literatura com poesias produzidas por impulso. Nelas
ele constatou, depois de certo tempo, que ali estavam inseridos aspectos
sombrios que povoavam sua mente. Seus escritos eram, segundo o próprio
Drummond, uma forma de clarear esses pensamentos conflitantes, exercendo um
papel muito salutar, tonificante para a sua alma. A literatura tinha, portanto,
efeito terapêutico para ele, aliviando a carga de problemas que carregava.
Assim, expressava-se na poesia, ainda que na linguagem simbólica, aquilo que era
inconsciente e que de certa forma o incomodava, sejam as injustiças, as belezas
ou simples passagens de vida em família e nunca antes devidamente explicadas ou
exploradas convenientemente. E ele se sentia aliviado ou até mesmo gratificado
por ali colocar aqueles “problemas”, expelindo-os de forma construtiva. A
literatura era seu “divã”, concluiu Drummond.
É
interessante a constatação de que, até mesmo nos contos de ficção, sempre há um
pouco de autobiografia. Aqueles que gostam de escrever, ainda que por puro
lazer e muitos de nós somos assim, sabem muito bem disso (crônicas que escrevo
só as libero para os amigos mais chegados, pois as leem com o os olhos do
coração e adicionam críticas sinceras, pois o que me move é o desejo de
crescer e co,mpartilhar as coisas boas da vida). Qualquer produção literária, não importa o gênero, sempre traz um
pouco da vida do autor. As crônicas, então, são terríveis nesse sentido. Nelas
o autor escancara os seus pensamentos e sentimentos, expondo-se totalmente. E
na verdade o cronista segue, quase sempre, o figurino descrito por
Drummond. Busca explicar, à luz de sua
vivência e conflitos internos, agora escudados em maior experiência e
respaldados em conhecimentos mais amplos, os fenômenos e acontecimentos do
cotidiano. Pela crônica adquirimos coragem de abordar as queixas ou ideias que
antes não pudemos ou tivemos coragem de fazê-las diretamente aos protagonistas
de outrora. E agora, às vezes, me pergunto por que esse impulso de escrever
sobre o cotidiano ou reminiscências da infância e juventude? Por que se sente
bem em sair pelas ruas e conversar com garis, catadores de lixo reciclável (e
até fotografar-se com eles), vigilantes, policiais em serviço, motoristas
profissionais, garçons, donos de estabelecimentos comerciais, babás e até
crianças que ainda mal sabem se expressar? São pessoas que exercem atividades
totalmente distintas daquelas para as quais fui treinado e me dediquei toda a
vida. Hoje, depois de tanto tempo, parece que acordei para a vida, a vida como
ela é, como dizia Nelson Rodrigues e não apenas aquele mundo profissional,
cercado pelos top minds, formal,
requintado e que lhe cercou por todo o tempo, no país e no exterior. Formalidade demais! Assim, hoje, ao procurar entender o outro, o próximo que está a seu lado e seu
modo de vida, ou simplesmente descrever uma experiência própria, comparando-a
com a atualidade e assim tirar lições que possam valer para si mesmo e todos
que delas tomem conhecimento é simplesmente “viver”. E assim, pela escrita,
prolongamos o prazer da vida.
Por consequência a tese de Drummond se aplica a todos nós que gostamos de escrever, ainda que de forma amadorística, ou seja, descobrimos ou simplesmente usamos a literatura ou a escrita, como terapia da alma e ao mesmo tempo levamos, por meio dela, mensagens construtivas para os amigos. E quando dizemos "escrita" incluímos as artes da pintura, da música e da fotografia, pois as fotos tem duas faces, a que é mostrada e a invisível, aquela que está por detrás da câmera, o pensar, a mensagem que o fotógrafo deseja repassar com a imagem por ele capturada. O pensador Rubem Alves soube expressar isso de forma mais poética ao escrever:
"Assim são as imagens poéticas: elas tem o poder de ir lá no fundo da alma, onde moram os esquecimentos e quando um desses esquecimentos acorda a gente sente uma estremeação no corpo. Essa é a missão da poesia: recuperar os pedaços perdidos de nós”.
Drummond e Alves estão certos. A escrita tem efeito terapêutico. Me estremeço diante de uma bela imagem como essa que abre a crônica, uma mulher, guerreira na luta pela sobrevivência Quer terapia melhor do que “descascar” um tema e dele tirar conclusões positivas ou simples desfechos que alegram os corações?
Paulo das Lavras
Entendendo a vida de uma catadora de lixo. Na infância a carroça do Tatá, o freteiro da pequena
cidade do interior, fazia sucesso entre as crianças que sempre queriam uma carona.
Falar com essa mulher guerreira, que ganha o seus sustento com uma humilde
carroça transitando pela região central de Brasília, em busca de materiais recicláveis,
foi como uma terapia para alma do menino que estacionou o carro e correu para a prosa e a foto,
não sem antes dar´lhe algum para o sustento do sofrido cavalo de tração.
Foto do autor - Brasília 2012
Conversando e aprendendo sobre a vida de uma policial
do Batalhão de Polícia Montada. Diante dos elogios
sobre a elegância do conjunto, sorriu para a foto. Ou melhor, gargalhou tanto
que até teve que se curvar para não cair do enorme cavalo
Foto do autor - Brasília, Esplanada dos Ministérios
Contando histórias e aprendendo com as crianças, enquanto aguardava-se o show
da Esquadrilha da Fumaça
Colhendo peras na chácara e ensinando o valor da natureza
Dando asas ao "sonho de Ícaro", tão desejado desde a infância..., voar, voar, subir, subir..
A vida toda cercada pela formalidade do trabalho. Chegando à Lavras
com o Ministro da Educação
Foto: Ascom-Ufla, 1994
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