Longínquo e inesquecível Sete de Setembro em um Colégio de Lavras
Pe. Raimundo desfilando com os meninos em 7 de Setembro de 1957
O
menino das Lavras adorava os desfiles do Dia da Pátria. Acostumado desde cedo a
ouvir os acordes do Hino Nacional e os toques protocolares dos militares do 8º
Batalhão de Infantaria, alimentava o sonho de um dia também desfilar. Nos
ensaios da tropa, com banda militar, a desfilar pelas ruas vizinhas, lá estava
com sua turma a marchar logo atrás dos garbosos soldados. Não perdia os
desfiles solenes de Sete de Setembro admirando os militares e os meninos dos
dois únicos colégios existentes na cidade – o Gammon e o Aparecida,
impecavelmente uniformizados com calça (comprida...!) azul marinho e camisetas
brancas. A empolgação era grande ao ver a ordem unida da tropa do Tiro de
Guerra 0264, unidade do Exército na cidade. O tintilar dos fuzis nas manobras
dos atiradores e o barulho característico das coronhas batendo, simultaneamente
no paralelepípedo ao comando de “descansar arma” fazia o menino vibrar com o
estrondo metálico que ressonava longe.
Seu
sonho se realizou ao completar 12 anos. Concluiu o curso primário e
matriculou-se no curso compacto, de férias, do Curso de Admissão ao Ginásio, do
Colégio N.S. Aparecida. Em março de 1957 já estava cursando a primeira série de
curso ginasial e em breve realizaria seu sonho de infância: desfilar com
uniforme do colégio no Sete de Setembro. Para isso muito contribuiu um dos
dirigentes e professor do colégio, o querido e admirado pela sua simpatia, Padre
Raimundo Weilherman. Além de suas boas e atrativas aulas de religião em que nos
ensinava as passagens bíblicas como ninguém, ele gostava de nos levar – os
novatos - para ensaiar o desfile. Era uma alegria constante, sermos dispensados
da última hora de aula para, capitaneados pela fanfarra e acompanhados por ele,
ensaiar o desfile cívico. Incansável e sempre com um sorriso, lá estava ele a
nos ensinar o compasso da marcha com seu refrão: esquerdo... direito... esquerdo...direito
e também como corrigir o passo errado, dando uma rápida quicada no calcanhar de
modo a quebrar o descompasso. Era ele que nos incentiva a “marchar bonito” para
brilhar em primeiro lugar no desfile. Na verdade a concorrência entre os
colégios era apenas uma forma de se incentivar um melhor desfile, sobretudo
entre as fanfarras concorrentes. Sempre achávamos que a nossa fanfarra era a
melhor, pois não cansávamos de ouvir elogios aos seus integrantes, com destaques
para os tarolistas que se desempenhavam com muita habilidade.
Tempos
memoráveis aqueles e graças ao trabalho de garimpagem iconográfica de um amigo
historiador e profundo pesquisador da história de nossa terra e nossa gente, o
Prof. Renato Libeck, o menino pôde encontrar e recuperar preciosas fotos. A
primeira foi justamente a do primeiro desfile, em Sete de Setembro de 1957,
onde aparece ao lado, logo atrás do saudoso instrutor e incentivador Pe.
Raimundo. O uniforme era o de gala, calça azul marinho e blusa de malha,
branca, com o nome do colégio. A segunda foto recuperada foi a do último
desfile, em 1963, quando estava no 3º ano do Curso Científico que corresponde
ao último ano do curso de 2º grau atual. Nessa foto o menino das Lavras aparece
ao lado de um fusca que conduzia a imagem da santa que empresta o nome ao
colégio e o traje, mais aprimorado incluía camisa social e gravata e não o
usual uniforme, imprimindo mais imponência e garbo no desfile.
Nessas
reminiscências que passam pela tropa do Tiro de Guerra e pelo colégio, destaca-se
um professor muito característico e querido pelos alunos, o Padre Luiz Tings. Com
forte sotaque alemão, tinha certa dificuldade em dominar o nosso idioma e os
meninos se aproveitavam disso para provoca-lo. Mas ele não se incomodava com
isso e até achava graça quando era imitado. Porém, havia uma situação que o
deixava extremamente irritado. Era quando, na primeira aula, às sete horas em
ponto iniciava a chamada de presença dos alunos. Os alunos que frequentavam o
serviço obrigatório militar, o Tiro de Guerra-TG, só chegavam meia hora depois,
com autorização e portanto sem que lhes fossem registradas as faltas naquele
primeiro horário. Quando algum deles, obviamente, não respondia à chamada, a
turma inteira respondia em altos brados e batendo o pé com força no assoalho de
tábua: “Tiro...Tiro”. O Pe Luiz olhava sério para turma e quando pensava que a
disciplina havia sido imposta... surgia outro nome de alguém que estava no TG e
a resposta e bate-pés, coletivamente, ecoavam novamente... Então o Pe Luiz,
extremamente nervoso, com a face vermelha, arregalando os pequenos olhos azuis,
gritava várias vezes “oh... vôs tem paciência..., vôs tem paciência”. Silencio
total, mas era só ele baixar as vistas sobre a lista de chamada e os risos
contidos escapavam furtivamente. Não raras vezes ele flagrava alguns rindo e eram
expulsos da sala. Nesse dia ninguém mais se atrevia a gritar o refrão dos
ausentes.
O
sonho do menino, embalado pelos acordes das fanfarras militares e dos colégios,
se realizou como desejado e repetiu-se por muitos anos. Porém, o que mais o
marcou foram as lições dos mestres que não se cansavam na contínua tarefa de
moldar o caráter daqueles pequenos, transformando-os em verdadeiros cidadãos
com amor à pátria, às ciências e às letras. A eles, os metres, devemos o que
somos. Ainda hoje recordamos com
nostalgia aquelas lições de civismo e as repassamos aos filhos e netos.
Levar os netos nessas solenidades comemorativas e de reverência à Pátria é um
prazer redobrado. É como se revivêssemos aquelas lições ministradas com amor e
carinho pelos nossos mestres. E o mais interessante, surpreendente mesmo, é que
parece que o tempo não passou... ao olhar aquela antiga foto e hoje ao assistir
a um desfile cívico ou show da Esquadrilha da Fumaça sente hoje, 56 anos depois,
a mesma emoção, prazer e alegria do menino de 12 anos, o mesmo menino, aquele
último da fila na foto do longínquo Sete de Setembro de 1957.
Brasília.
05 de abril de 2013
Paulo
das Lavras
Sete de Setembro de 1963 - O menino, 2º da primeira fila
Fanfarra colegial e os taroleiros
Colégio Aparecida a esquerda - década de 1950
Brasão do Colégio
Hasteamento da Bandeira - 7 Setembro 2012
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