Estava na chácara, tranquilo, cumprindo a quarentena imposta pela pandemia do Covid-19 e não pretendia vir para a cidade. Um pouco triste por não poder receber os netinhos para o indispensável bolo com velinhas e guaraná, já estava até resignado. Logo após o almoço, no entanto, instado que fui, partimos para a cidade. Ao chegar em casa, fui logo “obrigado” a levar para o porteiro algumas frutas trazidas da chácara. Foi apenas um pretexto para que eu me deslocasse até à portaria do prédio.
Ali estava a grande surpresa que sequer desconfiei. Lá estavam, recém chegados e estacionados, três carros conhecidos e deles desceram três famílias, as de duas filhas e uma terceira de amigos comuns de todos nós. Cada qual com seu filho, três crianças, os dois netinhos de 12 e 11 anos e o amiguinho deles que também me chama de vovô. Alinharam-se, respeitadas as distancias mínimas de dois metros impostas pelas regras sanitárias contra o Covid-19 e entoaram o famoso “Parabéns para você...”
Mudo, ali estatelado, do alto das escadarias e a uns cinco metros de distância e contendo as lágrimas de emoção, ouvi o tradicional “parabéns” . Em seguida a linda oração proferida por Pedro Henrique, pedindo as bênçãos de Deus sobre mim, concedendo-me saúde e que Ele acabasse, bem depressa, com a quarentena do coronavírus, pois estava com muita saudade do vovô, de seu abraço, vir à sua casa e tudo mais.
Depois de três semanas de afastamento social, privando-nos do convívio diário com os netos, do abraço, das prosas, do sorvete e das constantes visitas às bancas de jornais, futebol de salão e de gramados, aulas de inglês, estudos de matemática, geografia e história..., não foi fácil se segurar, me segurar ali, estático, contra o ímpeto de pular escadarias abaixo e abraçar, agradecer e compartilhar aquela alegria incontida com os meninos, seus pais e muito especialmente pela sincera oração do menino de 11 anos, pura, brotada do coração.
Agradeci a Deus, recolhi a tristeza momentânea e reforcei o pedido para que eu ainda possa abraça-los muito em breve. E ao final, também reconheci que tive de esperar 75 anos para ter um aniversário sem bolo com velinhas e com discurso de todos os presentes, adultos e crianças, de alto e bom som, em razão da distancia sanitária e show gratuito para os demais moradores que chegaram à janela. Amém!
Brasília, 05 de abril de 2020
Paulo das Lavras

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