Dizem
que sim. Saudade mata! Não sei, mas que dói, dói..., e muito. Mas, também acho
que depende do modo de vida, a vida que você levou ao longo de todo o tempo.
Quando criança brincava muito, vida livre em grande chácara, onde tudo era permitido
até mesmo caçar passarinhos, rãs, preás e pescar lambaris. Assim foi minha vida
de criança nos idos da década de 1950. Mais tarde, já no curso ginasial e
colegial, tomei gosto pelos estudos e com os destaques nas notas esse gosto
aumentou e ao final, a ponto obtive a melhor classificação no vestibular da
velha e famosa Esal/Ufla. Passada a fase de estudante veio a vida profissional
e novamente abracei com afinco e muita dedicação a nova profissão. E aqui vale aquele ditado, escolha a
profissão que você goste e ao final, não parecerá que você tenha trabalhado,
mas sim amado a vida como resultado de sua dedicação, pois tudo terá sido
prazeroso. E hoje, mais de 50 anos depois da formatura profissional, olho para
o passado e sinto-me orgulhoso daquilo que tive ou pratiquei na infância,
juventude, vida familiar e social e no trabalho profissional.
Mas,
porém, todavia, entretanto, contudo, não obstante, ainda assim e embora adore
olhar, relembrar o doce passado, isso traz e nos obriga a carregar uma enorme
carga de sentimento e, por isso mesmo entra a saudade matadeira. Mas, tudo é
muito relativo, depende muito do que você gostava de fazer e sobretudo quem
você carrega no coração. Dizem os especialistas que a saudade em vez de matar,
pode trazer a cura, fazendo a vida valer a pena. E é mesmo! Minhas saudades são
reminiscências das passagens mais gostosas da vida, aí incluindo-se não só os
fatos e eventos que marcaram minha alma, mas principalmente as pessoas queridas
que, por longo tempo com elas convivi e aprendi a viver e escolher uma
profissão. E esse tipo de saudade não passa nunca, pois sempre há algo ou
alguém, dos quais estamos sentindo falta. E quase sempre dói e dói muito. Um
exemplo, quando passo de avião a dez mil metros de altura sobre a cidade natal
e a vejo aninhada entre a serra da Bocaina e o Rio Grande. Os quinze ou vinte
minutos restantes do voo, para a chegada ao aeroporto do Rio de Janeiro, passam
num piscar de olhos, tal a intensidade da imersão da mente que destrava o
subconsciente e faz rolar um longo filme das melhores e saudosas recordações da
infância e juventude ali vividas. Interessante notar que quanto maior a
distância no tempo e espaço – vivo a 1.000 km e há 44 anos distantes da terra
natal – maior o sentimento de se reviver todo o passado que se descortina ali,
na sua mente, destravado e desencadeado que foi com a visão real do local onde
se viveu. Mas, esse dourado exílio em distantes terras dá ferroadas implacáveis
com doloridas reminiscências, que somente são aplacadas com as lambidas no doce
da vida. E há, por ventura, melhor “doce” do que rever a terra natal? Ah...,
nem preciso aqui invocar os poemas de Olavo Bilac, Guilherme de Almeida ou Gonçalves
Dias para se comprovar isso. Os poetas têm razão. Quer ver? Sei medir as
montanhas, apenas com uma visada, melhor que as planuras de Brasília, embora
nestas tenha residido a maior parte da vida.
Mas,
afinal, a saudade mata? Repito, não sei, depende..., mas que dói, dói..., e
muito. E muito mais pelos entes queridos, A
saudade, a solidão, são apenas companheiras de viagem. Diz a sabedoria que, às
vezes, a ausência de luz é necessária para que a valorizemos. É na escuridão,
no vazio do pensamento, que residem as melhores reflexões que nos conduzem à
valorização do amor, das amizades às pessoas, com a certeza de que nunca
estamos sós, pois embora distantes, sabemos que podemos voltar para a casa,
nosso lar, refúgio e fortaleza. Assim é a infância, nosso passado. Ela é, por
essência, a nossa casa. Nela podemos adentrar pelos escaninhos da alma, a
qualquer instante.
Rever o passado e suas imagens é como explicam os
psicólogos, lembrar-se exatamente do local e eventos onde estivera muito tempo
antes. É uma característica de nossa mente que “grava” com maior intensidade
aquilo que foi marcante em nossa vida. É a chamada memória cintilante. Agora,
potencializada com a emoção de rever, presencialmente, os espaços físicos
daquela época, muitos ainda preservados no original. Revê-los é como disparar,
destravar o subconsciente que tudo gravou..., pura alegria, doce sentimento! E nesse sentido a saudade da infância é ser
feliz!
Que venham as saudades, pois
são sinais de que fomos e somos felizes no amor que fica em nossa alma!
Brasília, 28 de fevereiro de
2019
Paulo das Lavras.
A saudade pode se
transformar em fonte de cura que faz a vida valer a pena.
Assim dizem os especialistas. E rever as montanhas de
Minas, de fato é um remédio
para quem vive
distante da terra natal.
Foto: Ronaldo Leonardo Renoir - cidade de Lavras e serra da Bocaina - 2019
Sei medir as
montanhas, apenas com uma visada, melhor que as planuras de Brasília,
embora nestas
tenha residido a maior parte da vida.
Foto do autor – Serra
de Igarapé, caminho da terra natal
A antiga Escola Superior de Agricultura de
Lavras- Esal, estudante de 1964/67, hoje Ufla
Foto: arquivos de Renato Libeck
50 anos depois, comemorando a formatura.
Foto: Gilnei Duarte – setembro 2017
Paul McCartney,
autor de Penny Lane, letra que canta a saudade de sua rua, diria para essa foto: essa foi uma “lambida”
sensacional no doce da vida. E foi mesmo!
Senti até o cheiro
da viagem de Lavras à Itaúna, na maria-fumaça que soltava fagulhas de carvão e
impregnava os vagões de passageiros com o cheiro característico. Eram 16 horas
de longo percurso, saindo da Estação Costa Pinto, às 17:00h para só
chegar no dia seguinte às 9:00h da manhã,
em 507 km de
ferrovia. O internato no Seminário esperava pelo menino e foi um longo ano...
Foto do autor – São
Lourenço/MG – 2014