Incomoda-me
bastante a celebração de certas datas comemorativas. Natal, Dia das Mães, Dia
dos Namorados e Dia dos Pais se encaixam perfeitamente no modelo. Hoje em dia
todas elas são movidas quase que exclusivamente pelos interesses econômicos. O
lucro comercial fala mais alto. É impressionante o poder que o comércio tem de
sequestrar as datas comemorativas, tomando-as unicamente para a promoção de
seus negócios lucrativos. Se pesquisarmos a origem de cada um desses eventos
vamos verificar que os mesmos foram criados com os mais nobres objetivos. O Dia
dos Pais foi criado nos EUA para homenagear a memória de certo pai que, viúvo
prematuramente, criou seus filhos com dificuldade e sem ajuda de ninguém. Tinha,
portanto, o objetivo fortalecer os laços familiares e o respeito por aqueles
que nos deram a vida. Na Itália, Portugal e Espanha é comemorado no dia 19 de
março, dia de São José, o pai da Sagrada Família. No Brasil foi comemorado pela
primeira vez em 14 de agosto de 1953, dia se São Joaquim, considerado o
patriarca da família. Porém, foi mudada a data para o segundo domingo de agosto
por pura motivação comercial, conforme atesta a literatura. Foi um verdadeiro
“sequestro” da data por parte do comercio com a conivência da mídia que
sobrevive às suas custas.
Observe
que cada grande promoção do comercio está milimetricamente planejada e
distribuída em meses estratégicos do ano. E mais, sempre no segundo domingo do
mês. Sabe por que esse dia da semana? Para pegar o seu pagamento que
normalmente sai até o 5º dia útil do mês. Ora, vai que no primeiro domingo
ainda não tenha saído o pagamento e no terceiro você já terá pago todas as
contas e carnês de prestações e... não sobrou nada para a festa.... Como
comprar presentes, gastar em restaurantes e supermercados, viagens...? Bem
pensado, não? Mas, voltando ao calendário superlanejado, primeiramente vem a
festa mor, o Natal. Em seguida abate-se uma tremenda ressaca financeira
familiar decorrente dos gastos astronômicos. Então espera-se um pouco mais,
digamos três meses, para que a família reconstitua os gastos exorbitantes
naquela festa máxima onde os presentes, obrigatórios, diga-se, começam pelo
porteiro, passam pelos garis, empregados, flanelinhas, caixas de bares,
restaurantes e supermercados, colegas de trabalho, atendentes de consultórios
médicos e dentistas chegando, finalmente, à família. Nesta, não bastassem as
viagens internacionais, troca do carro zero, ou o último modelo de celular com
tela de cinco polegadas e tablets para as crianças recém desfraldadas, ou
melhor de três anos, é obrigatório promover uma comilança pantagruélica que se
inicia no dia 23, antevéspera do natal e se estende até a madrugada do dia 31
de dezembro, a virada do ano. Haja disposição para tanta comilança com bacalhau
nas alturas e os precinhos “camaradas” de perús, tender, pernil e frutas secas
da Turquia sem contar com vinhos e espumantes nacionais com precinhos em dobro
dos congêneres importados. São três meses de pausa, uma espera estratégica para
a reconstituição das finanças familiar e também o tempo necessário para a
digestão de tamanha comilança (há que se perder os 2 kg que sempre ganho nessa
época de festança. Sempre brinco com o dono da farmácia onde há uma balança.
Digo que ele a desajusta em 2 kg, para mais, depois das festas de fim de ano e
só a conserta em março, coincidentemente com a chegada das festas do chocolate
pascoalinos).
Depois
dessa pausa, de início de ano, vem a festa da Páscoa e... tome chocolate em
embalagens especiais que custam o olho da cara, comprado no comercio local ou
mesmo em Gramado, aproveitando-se a oportunidade para uma viagem de férias....
e como sempre o comercio faturando alto. Ah..., mas a venda de chocolate é
muito limitada, com apenas esse produto? Sim, mas no mês seguinte vem o Dia das
Mães. Esta sim o comercio adora, pois é a segunda em faturamento perdendo
apenas para o natal. Satisfeito? Espere, ainda vem logo em seguida, no mês de
junho, a terceira em faturamento, o Dia dos Namorados. Esta, além do glamour, é
cercada de toda uma encenação com apelos românticos e não há quem não se renda
diante de tanto bombardeio comercial nas mídias. Até as vovozinhas chamam seus
maridos num canto e discretamente dizem que ainda são “sua namorada” e
perguntam com lânguido e amoroso olhar: “amor... o que vou ganhar de você que é
meu eterno namorado, hein?”
Assim
vai o calendário comercial rodando a cada mês com suas “promoções”, chegando
agora, em agosto..., no segundo domingo e com salário no bolso, o Dia dos Pais.
Pois bem, me dei ao trabalho de consultar os principais meios de comunicação e
nada encontrei de altruísta para esse “tão propagandeado” dia. Só oferta de
presentes como viagens internacionais, sapatos, tênis, whiskies blue label a
barbeador de 960 reais. Além disso, um restaurante sofisticado oferece sorteio
de três imperdíveis prêmios, um vale viagem de cinco mil reais, duas diárias em
hotel resort em estância de aguas termais, e um Ipad2 de 16GB Wi-Fi. A promoção
vale para consumo durante todo o mês de agosto, o “mês dos pais”...
Por
que a imprensa não procura valorizar os pais nesse seu dia festivo? Falar dos
valores da família, o papel do pai, a influência na formação e educação dos
filhos? Por que não falar das reminiscências da infância dos filhos e deles
próprios, do papel dos avós - os segundos pais, a superação de desafios no seio
da família? Os filhos brilhantes? Quer maior elogio aos pais do que falar do
sucesso dos filhos? E das mães que desempenham o duplo papel “pai e mãe”. Como
é ser pai nessas condições? Por que na maioria das vezes as mães são compelidas
ao trabalho fora de casa e frequentemente são as únicas provedoras ou, no
mínimo, ajudam o marido no reforço do orçamento? Lógico que nesse caso o
comercio e a imprensa subserviente se calam. Falar dos prejuízos eventuais que
isso poderia causar aos filhos e à sociedade? Não, melhor é deixar que ambos
ganhem mais, aumentem a renda e assim comprem mais e mais... É a tal sociedade
consumista onde a pessoa vale pelo que tem e pode ostentar e não pelo que é,
pelos valores pessoais que possui. Valorizar os pais não significa apenas
elogiar ou presentear e se quiser sair da mesmice por que não abordar temas
sobre a relação pai-filho na atualidade? Pais exigentes, permissivos ou pai
para toda obra... Temas empolgantes não faltam. Faltam sim, vontade e ética por
parte desses mercadores dos sentimentos.
Mas,
esqueçamos o efeito danoso do consumismo moderno que incentiva a
mercantilização das datas comemorativas e vamos aproveitar para celebrar o paterfamiliae, no sentido paterno que
lembra o amor de pai, carinhoso e afetuoso. Assim, receberemos o maior presente
que um pai pode esperar: o carinho dos filhos, reunidos à mesa para um solene
almoço e não apenas os pacotes de finas estampas com presentes sofisticados.
Aliás, me perguntaram que presente eu gostaria de receber e a resposta não
poderia ter sido outra: sua presença e toda a família no almoço de domingo,
pois o presentinho que eu desejo, um helimodelo Logo SX, que pode voar até a
300km/h está muito caro, seis mil reais e desisti... . Lógico que ganhar um
livro, uma gravata ninguém está imune e esses mimos se prestam também para a
educação dos netinhos. Tomara que o Dia dos Pais, das Mães, dos Namorados e
outros tantos sejam lembrados na dimensão que merecem e não apenas como uma
promoção comercial de compra/venda e entrega de presentes. O maior presente que
os pais podem receber está no coração de cada um de nós. Amanhã, 11 de Agosto, é
dia de mostra-lo..., o amor a eles, os pais, ainda que ausentes, com uma prece
de gratidão!
Um
Feliz dia dos Pais para todos.
Brasília,
10 de agosto de 2013
Paulo
das Lavras
Clovis Pereira da Silva
Homenagem ao pai do Menino das Lavras.
Foto de 1935, aos 29 anos, vésperas do
casamento.
Faleceu com 101 anos de vida, em 12/2007