Publicado: 31/03/2019 - http://contosdaslavras.blogspot.com/2019/03/o-algodao-as-ovelhas-de-producao-de-la.html
Minas Gerais tem
preciosidades peculiares e suas origens remontam à imigração portuguesa,
provocada pela febre do ouro iniciada nos primórdios do século XVIII. Não foi
diferente na região de Lavras, nos Campos das Vertentes próximo ao sul de
Minas. O Arraial dos Campos de
Santana das Lavras do Funil, hoje simplesmente chamado de Lavras, foi fundado por volta de 1720, quando os
bandeirantes paulistas, na sua maioria de origem portuguesa, descobriram
aluviões de ouro nos ribeirões Vermelho e da Faisqueira, afluentes do rio Grande.
Vários outros córregos também tinham o ouro de aluvião, embora em pequenas
quantidades e que logo se esgotaram. As marcas das escavações e garimpos do
ouro ainda hoje se encontram ao redor da cidade, pois provocaram erosões nos
leitos e nascentes dos riachos formando, ao longo do tempo, verdadeiras
voçorocas, enormes “buracões”. É assim no final do bairro Centenário, bem atrás
do prédio da prefeitura e também na antiga “trans-Zica”, logo atrás à igreja do
Rosário e ainda na vila Murad nas proximidades do bairro Jardim das Palmeiras e
rodoviária intermunicipal. Essas enormes chagas , vermelhas, podem ser notadas
mesmo a 10 mil metros de altura, quando por lá passamos de avião nas rotas Brasília/Rio
ou BH/São Paulo. São várias essas cicatrizes, as lavras do ouro, que originaram
o nome da cidade que ficou famosa entre os exploradores do século XVIII. Ali
existia um grande estreitamento do rio Grande, formando um funil um pouco acima
da foz do ribeirão vermelho. Era o ponto ideal para a travessia do caudaloso rio
a caminho dos “sertões dos Goyases”. Tanto assim que a Coroa tratou de logo
instalar, bem ali no funil do rio, um posto de registro para fiscalização e
coleta de impostos sobre o ouro. Ainda hoje existe a casa sede da fazenda do
Registro, na estrada que liga a cidade de Lavras à ponte do Funil. Essa
importante ponte metálica, construída de 1844 a 1869 foi inundada, no ano de
2002, pela represa da usina hidrelétrica
do Funil.
A
descoberta de ouro nas minas “geraes” e no sertão dos “goyazes” tornou-se
verdadeira febre, logo no início do século XVIII, quando milhares de
portugueses emigraram para cá em busca da riqueza do metal reluzente. A
emigração de Portugal foi tão grande que o rei chegou a baixar um decreto
proibindo a vinda de seus cidadãos para o Brasil. Mesmo assim, meu pentavô, o
português Manoel da Costa Vale, foi motivado a deixar sua terra natal, em Balazar/Póvoa
de Varzim na região do Porto e emigrar para o Brasil, ainda menino, lá pelo ano
de 1720. Chegou à Carrancas por volta de 1750, vindo de Guaratinguetá, onde
casou-se com Maria do Rosário Pedroso de Moraes. Quando chegou à região de
Lavras, que pertencera à Carrancas, as jazidas auríferas já haviam se esgotado
e por isso Manoel da Costa Valle se fixou à margem direita do rio Grande, abaixo da foz do ribeirão
vermelho, região de terras férteis e abundância de peixes tanto no rio como nas
lagoas que se formavam por ocasião das vazantes. Essas lagoas temporárias eram
verdadeiros reservatórios de peixes e o menino chegou a participar de algumas
pescarias de curimãs e dourados, com redes de arrasto nas lagoas da fazenda Jacuba, de nossa propriedade e da vizinha fazenda Maria
Jerônima, que pertencia aos herdeiros de Antônio Alves de Pádua, primo dos
Salles, ambas situadas à margem esquerda do rio, cerca quatro a cinco
quilômetros abaixo da cidade de Ribeirão Vermelho.
Dentre
os costumes agrícolas da península ibérica, o imigrante Manoel da Costa Vale trouxe
consigo o gosto pelos doces de marmelo, de pera e de figo, além de incorporar as
frutas tropicais para o consumo in natura e feitio de doces em calda ou em
pastas, especialmente a goiaba, com sua famosa goiabada que substituía muito
bem a marmelada. Além das culturas nativas, logo incorporadas à alimentação
como o milho, a mandioca, o feijão, os portugueses trouxeram o algodão para a
confecção de tecidos e ovelhas para produção de lã. Tal qual em Portugal, cabiam
às mulheres as tarefas de fazer os doces em grandes quantidades em cada safra,
guardados e conservados em caixetas de madeira e mais tarde em vidros de
boca larga. Também
eram tarefas delas beneficiar e fiar as fibras do algodão e as lãs das ovelhas, criadas extensivamente nas fazendas. Interessante notar que os homens da
fazenda não se envolviam nessas atividades de beneficiamento e fiação do
algodão e da lã. A eles eram reservadas as outras tarefas do campo, embora as
mulheres também os ajudassem no plantio, capina e na colheita dos grãos. Havia
em nossa fazenda Retiro dos Ipês, na região das Três Barras, uma pequena
plantação de algodão, cultivada desde o ano1935, quando meus pais se casaram e
ali fixaram moradia. Na década de 1970 ainda havia um último exemplar de
algodoeiro que sobrevivera anos a fio, encravado na beira do alicerce da casa.
A fazenda Retiro
dos Ipês, construída no início do século XX, como parte da
Fazenda Três Barras, no município de Lavras-MG, foi ampliada em 1930 e 1935. Foi adquirida
por meus pais em 1935 e ainda pertence à família. Estilo colonial português,
com telhas de barro artesanais, portas e janelas de madeira maciça, com
vidraças e cimalhas em relevo nos beirais. Assoalho de madeira peroba e ipê. À
direita localiza-se o grande pomar com muitas variedades de fruteiras, além do
cultivo de algodão e criação de ovelhas
Foto do autor –
2014
Ainda
hoje coleciono alguns equipamentos da época, como o “descaroçador” de algodão,
cuja operação era a primeira na sequencia do beneficiamento da fibra para a
tecelagem, juntamente com a lã de ovelha. A criação de ovelhas para produção de
lã se situava na Fazenda Três Barras, em Lavras, de propriedade de minha avó paterna, Amanda
Custódia de Abreu, localizada a dois quilômetros de distância de nossa casa, a
Fazenda Retiro dos Ipês. Minha mãe possuía nessa fazenda pequeno rebanho de
vinte cabeças de ovelhas, que produziam boa quantidade de lã.
Distribuíam-se, juntamente com as demais ovelhas de minha vó, pelas pastagens
que ocupavam toda a margem direita da atual rodovia Fernão Dias - BR 381, desde
a ponte sobre o ribeirão Maranhão até o antigo cruzamento da estrada de rodagem
que ligava Lavras a Nepomuceno (Posto
Sandrelli, km 635). A criançada se divertia com o rebanho,
especialmente com os carneirinhos recém-nascidos, de lã
aveludada, sedosa. Eram mansinhos, próprios para serem aconchegados ao colo.
Adoravam uma mamadeira improvisada com leite de vaca e vivíamos a disputar quem
os alimentariam. Aliás, as ovelhas são de uma docilidade fora do comum. São
animais indefesos, presas fáceis para os predadores, pois não possuem nenhum
meio de autodefesa. São altamente dependentes dos cuidados do pastor. Tanto
assim que na bíblia somos comparados às ovelhas, cujas almas são conduzidas
pelo Grande Criador. Há até um belíssimo salmo: “O Senhor é meu Pastor e nada
me faltará...” invocando a ajuda justamente quando nossa alma está ferida e ficamos
vulneráveis, como as ovelhas. A Bíblia
também ensina que: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu as conheço, e elas me seguem”. E
é verdade, as ovelhas conhecem a voz de pastor, seu protetor que as levam para
pastar, beber água e as recolhem em lugar seguro para o pernoite, além de guia-las com o longo cajado, impedindo-as de caírem no precipício, pois pouco enxergam. Há relatos em
que muitas delas, pertencentes a diferentes rebanhos e pastores distintos,
mesmo quando misturadas no local do bebedouro, seguem seu pastor ao ouvirem a
sua voz. Sejam lá quantos forem os rebanhos e respectivos pastores e nenhuma
ovelha segue a outro pastor que não o seu. Impressionante a fidelidade a seu
protetor que lhe alimenta, provê água e a protege. Esta é a característica mais
marcante de uma ovelha. E o amor é recíproco, conforme nos ensina o livro das
sagradas escrituras: “Se apenas uma de cem ovelhas estiver faltando, o pastor
recolhe as noventa e nove e parte em busca daquela desgarrada e só volta depois
de encontra-la”. São impressionantes os relatos bíblicos sobre as ovelhas e a influência
que esse amor exerce sobre as pessoas. Certa vez, em visita à Faculdade de
Zootecnia de Uruguaiana-RS, o diretor nos ofereceu um churrasco e havia carne
de cordeiro mamão. Minha esposa perguntou que carne seria aquela. Explicaram
que era carne de filhote da ovelha, o cordeirinho que ainda mamava, por isso
chamado de “cordeiro mamão”. Travou-lhe o apetite, por pura compaixão e lembranças
das histórias bíblicas sobre a docilidade e o apego que as ovelhas têm ao seu
pastor.
Fotos ilustrativas – Internet
É importante resgatar um pouco da história da
criação de ovelhas na região de Lavras, no Campo das Vertentes e boa parte do
sul de Minas Gerais, ainda que tivesse apenas o objetivo de
produzir lã para consumo familiar na tecelagem artesanal. O rebanho de ovinos,
originário da Europa, principalmente de Portugal e Espanha, se caracterizava
pela produção de lã fina. No final do século XVIII a raça Merino se espalhou
para a Inglaterra e toda a América do Sul. Na província de Minas Gerais a criação
de ovinos lanígeros se distribuía em
quase todas as fazendas do vale do Rio Grande, onde a maioria das propriedades pertencia a imigrantes portugueses que vieram em busca do ouro. Região de clima
temperado, com invernos muito frios nas áreas serranas, os imigrantes trataram
logo de produzir seus agasalhos de lã, como de costume na terra-mãe. Ainda hoje,
por exemplo, encontram-se vestígios e registros históricos desse costume de tecelagem artesanal em
municípios da
região da antiga comarca do Rio das Mortes, começando por Prados, Resende
Costa, Cel Xavier Chaves, Ibituruna, Perdões, Lavras, Itumirim e São João Del
Rey. Em todas essas localidades havia tecelagens artesanais. A lã e o algodão
produzidos em nossas fazendas de Lavras eram beneficiados e enviados a uma tecelagem
artesanal, na região do ribeirão da Faisqueira, abaixo do rio Capivari, próximo
a Itumirim, o antigo povoado do Coruja. Este fazia parte do então distrito de
Rosário de Lavras, onde inicialmente viveu o capitão Francisco Bueno da
Fonseca, paulista de Taubaté, um dos fundadores do Arraial dos Campos de
Santana das Lavras do Funil do Rio Grande.
Fazenda Três Barras, dos avós paternos, Amanda Custódia
de Abreu e José Pereira da Silva.
Casa sede (pequeno retângulo vermelho), localizada
no cruzamento da Rodovia Fernão Dias- BR 381 com a antiga estrada de terra que
ligava Lavras a Nepomuceno. Situava-se no exato local onde hoje se encontra o
Posto Shell-Sandrelli II. A área assinalada em azul era a pastagem do rebanho de
ovelhas.
Ali, na sede da fazenda, ajudávamos nossa mãe a tosquia-las.
À esquerda, em baixo, na cor verde, a rodovia que
liga Nepomuceno à BR 381.
À direita, no alto da foto, em cor marrom, a
cachoeira da Bebela, na rodovia 265, Lavras/Fernão Dias.
Finalmente, à direita, em cor lilás (pequeno
losango), a sede da Fazenda Retiro dos Ipês, onde moramos até 1948 e depois
passávamos todas as férias dos anos letivos.
Foto: Google - 2019
As
mulheres tecedeiras eram verdadeiras artesãs que, recebendo apenas as meadas e
novelos de fios, tingidos em variadas cores, teciam lindas e pesadas colchas
que nos protegiam do rigoroso inverno do sul de Minas. Ainda hoje, tenho
guardadas aquelas colchas, com as iniciais de meu nome bordadas e preparadas para o menino seguir para o internato, na distante cidade de
Itaúna, em 1958.
Maria Alves de Abreu (1948, aos 34
anos) e suas colchas de lã. Mãe guerreira, pastora de ovelhas.
Perfil típico das origens portuguesas, artesã, dedicada ao lar e à
dura labuta no campo das plantações e rebanhos
As colchas de lã ainda hoje guardadas,
sendo uma especialmente preparada com as
iniciais do menino que foi para o internato em um Seminário, aos 12 anos de
idade.
Foto do autor –
2018
Outro
aspecto interessante a considerar sobre a prosperidade da criação de ovelhas de
lã no sul de Minas, é que a região montanhosa de Lavras, com altitude média de 900
metros e clima ameno, favorecia a criação de ovinos lanígeros, pois é sabido
que o calor afeta os animais, fazendo-os perderem a lã na segunda geração.
Assim, a importação desses animais, vindos diretamente de Portugal e mais tarde
da França, onde, aliás, aprendi esse detalhe, no Castelo de Rambouillet, na
Bergerie Nationale, o CentroNacional de pesquisas sobre ovelhas. Esse famoso
castelo era usado pelo rei Luiz XVI que ali mantinha uma fazenda especialmente
para a caça de faisão e outros animais que, ainda hoje, abriga a fauna
silvestre, destacando-se os faisões que saem em revoadas quando nos
aproximamos. Verdadeira maravilha. Pois bem, o rei tinha ligações com a Espanha
e dali importou raças especiais na produção de lã, especialmente a Merino,
muito comum no sul de Minas na primeira metade do século do XX. Assim, devido
às condições favoráveis do clima do sul de Minas, não houve nenhum prejuízo de
ordem genética nas ovelhas. A tosquia, tosa ou corte da lã, era realizada na
primavera a fim de que se evitassem queimaduras do sol de verão na pele do
animal, que fica desprotegida sem a lã. Quando chegava o verão, de intensa
luminosidade e temperaturas mais elevadas, já havia crescido uma camada de lã,
com dois a cinco centímetros de espessura. Isto tornava o conforto térmico mais
ameno, pois a lã, devido à sua oleosidade natural, não deixava penetrar o sol,
a chuva e o frio, mesmo baixa, com pouca espessura. O pastoreio permanente não
era necessário ali no sul de Minas, pois não havia predadores, lobos nem onças,
naquelas pastagens e matas serranas ou marginais ao ribeirão Maranhão, afluente
do Rio Grande. Esse ribeirão que nasce na região do Farias, recebe, ali, as
águas de seus três afluentes, originando-se assim o nome da região, Três
Barras. Era uma extensa área que começava no Grotão e Fábrica Velha, à margem
esquerda do Rio Grande, logo abaixo da grande ponte sobre o rio, na rodovia BR
381, onde havia o porto de atracação do Vapor Dr. Jorge. Essa importante
embarcação de passageiro e carga, importada dos E.U.A (as mesmas barcas do
Mississipi), ligava Ribeirão Vermelho a Capetinga, desde 1890. As terras da
fazenda Três Barras, antes de sua divisão entre familiares se estendiam até o rio
do Cervo, também afluente do rio Grande.
A
região abrangida pelas fazendas Três Barras, Grotão e Fábrica Velha era a mais
populosa de Lavras, pois ali se instalaram quatro grandes famílias de origem
portuguesa, os Sales, Pádua, Abreu e Pereira da Silva. Foram dos primeiros
povoadores do Arraial dos Campos de Santana das Lavras do Funil, fundado em
1720, no mesmo ano de criação da Província das Minas Gerais, que se separou de
São Paulo. Os Sales (meu ramo) e os Pádua são primos, pois ambos descendem de Antônio
de Pádua da Silva Leite (1765-1849),
filho do patriarca Manoel da Costa Vale (1704-1783). O sobrenome Pádua foi
colocado em homenagem a Santo Antônio de Pádua, pois o pai, Manoel, havia
recebido uma graça daquele santo português, mas canonizado na cidade de Padova
(Pádua), na Itália. Do segundo casamento de Antônio de Pádua da Silva Leite,
nasceu o primeiro filho, Saturnino de Pádua (1811-1888). O segundo filho foi batizado com o nome
de Fortunato Antônio de Sales (1813-1877)
em homenagem a São Francisco de Salles de quem havia recebido uma graça (os
portugueses eram muito devotos). Aí está, portanto a origem dos sobrenomes
diferentes, mas filhos dos mesmos pais.
Interessante notar que inicialmente os Pádua
ocuparam a margem esquerda do rio e os Sales a margem direita, nos primeiros
seis quilômetros rio abaixo. Antônio Alves de Pádua (1769-1849), o Tonico de
Pádua, era filho de Saturnino e herdou toda a margem esquerda do rio Grande. A
margem direita, depois das propriedades dos Sales (cinco ou seis quilômetros
abaixo) ficou com seu irmão João de Pádua, a Fazenda Bela Vista que se situa
logo após a atual ponte sobre o Rio Grande (Rodovia Fernão dias BR 381), cerca
de cinco ou seis quilômetros distantes de Ribeirão Vermelho. Essa propriedade,
de João de Pádua, atravessava o Rio Grande e nessa margem esquerda, fazia divisa com seu irmão Tonico, se estendendo
quilômetros acima da margem do rio, chegando onde hoje se situa a fazenda
Criminoso. A extensão de terras que coube a Tonico de Pádua e seu irmão João de
Pádua, era enorme, pois alcançava cerca de quatro a seis quilômetros de largura,
chegando, rodovia acima, em direção a São Paulo, até o Rio do Cervo, ocupando
praticamente toda sua margem direita até a foz com o Rio Grande.
A
população dessa grande região rural de Lavras ampliou-se ainda mais com a
instalação da fábrica de tecidos, em 1890, na fazenda Dr Jorge (de Tonico de
Pádua) que contava com um porto de atracação da linha fluvial de carga e
passageiros. Os Sales, Abreu e Pádua se entrelaçaram não só com suas grandes extensões
de terras, partindo de Ribeirão Vermelho, Perdões e divisa com Nepomuceno pelo
Rio do Cervo, mas também em casamentos entre primos de segundo e terceiro
graus. Mais tarde, já no início do século XX, para lá também se mudou outra
família de Ribeirão Vermelho os Castro/Ramalho que se instalaram na Fazenda do
Grotão, situada entre os Pádua (Fábrica Velha/BelaVista/Criminoso) e os Sales
(Três Barras). Os Sales se instalaram inicialmente, desde a chegada à Lavras em
1750, à margem direita do rio Grande, nas fazendas do Açude e Limeira, hoje
municípios de Ribeirão Vermelho e Perdões. Dali, já no século XIX, alguns dos
filhos de meu bisavô, Domingos Pereira de Sales (1850-1929, filho de Fortunato Antônio
de Sales) atravessaram para o outro lado do rio e se instalaram na imensa
fazenda Três Barras, dividindo-a com os Abreu e Pádua. Na mesma época, mais
precisamente no ano de 1886, meu avô paterno, José Pereira da Silva, ainda
menino, mudou-se para a mesma fazenda Três Barras, que fora dividida e parte
dela vendida à sua mãe, viúva, Anna Custódia do Nascimento. Anna Nascimento
havia vendido sua Fazenda do Engenho à Companhia Estrada de Ferro Oeste de
Minas que ali construiu todo o complexo ferroviário de Ribeirão Vermelho,
incluindo a belíssima rotunda, hoje em ruinas. Anna Nascimento também plantava
algodão e criava ovelhas na antiga fazenda do Engenho. Portanto, tanto minha
mãe, da família Sales/Abreu, como meu pai, Pereira da Silva/Abreu, tinham no sangue
a vocação para a produção de lã e algodão para tecelagem.
O livro
“Minha Aldeia - A pérola do Rio Grande”, de Marcio Salviano Vilela descreve a casa sede da Fazenda
do Engenho que pertenceu à minha bisavó, Ana Custódia do Nascimento (fls 117 a
119). Construída na
segunda metade do século XVIII., com espaçosa cozinha, em
anexo interligado, madeiramento de peroba, frente e lateral voltadas para o
nascente, em direção ao Arraial dos Campos de Santana das Lavras do Funil,
fundos voltados para o rio Grande na direção da serra da Jacuba.
Havia muitos quartos, alguns sem janelas e ligados a outros maiores. No
porão ficava a senzala com
as correntes de aprisionar os escravos. O barulho do
arrasto das correntes perturbava
o sono dos senhores do engenho.
Fotos: acervo de Renato Libeck
O casarão localizava-se nos
fundos da igreja matriz de Ribeirão Vermelho, na colina da curva da estrada de
ferro (assinalado em vermelho na foto aérea). O último morador desse casarão
foi o casal Francisco Rodrigues Pato e Georgina Pereira Patto, que a demoliram em
meados da década de 1960, dando lugar à nova rua Clito Cleto Novais, conforme registrado
pelo autor do livro.
Na foto panorâmica, de 1992, além do local da sede da Fazenda do Engenho, vê-se ainda
a
ponte ferroviária sobre o rio Grande.
Fotos: acervo de Renato Libeck
José
Pereira da Silva, o filho de Ana Nascimento, mesmo morando na fazenda Três
Barras, foi a Ribeirão Vermelho buscar sua noiva, Amanda Custódia de Abreu. Desse
casamento nasceu, dentre outros, Clóvis Pereira da Silva que desposou Maria
Alves de Abreu (Abreu/Salles), do clã Gaspar de Abreu também povoador do Arraial de Santana
das Lavras do Funil e já residente na Fazenda Três Barras por mais tempo.
Assim, meus pais, Clóvis Pereira e Maria Alves de Abreu, descendem de famílias
portuguesas, emigradas para Lavras em seus primórdios. Da península ibérica, os
portugueses trouxeram e conservaram o costume de produzir seus próprios tecidos
com fibras de algodão e lã ovina. Portanto, o algodão e as ovelhas sempre
estiveram presentes na vida do menino até o final da década de 1950. Também as
plantações de variadas fruteiras nativas da região e principalmente aquelas
cultivadas em seu país de origem, de clima temperado como o figo, marmelo,
pêssego e pera, ainda que em pequenas quantidades no pomar doméstico, faziam
parte da tradição portuguesa. Nunca faltavam, na fazenda Retiro dos Ipês,
frutos para as deliciosas geleias, compotas em calda, licores e doces em
caixetas de madeira, tais quais nas origens portuguesas e para total alegria e
desfrute das famílias, especialmente das crianças. A esses costumes incorporou-se
também a goiabada com queijo branco artesanal. Não é, portanto, de se admirar
que a indústria artesanal de doces e tecidos de lã e algodão tenha prosperado na
região dominada por descendentes dos desbravadores portugueses. Produziam de
tudo em suas fazendas, do açúcar ao azeite de mamona que acendia seus
candeeiros que iluminavam as casas. Aliás, o nome “fazenda” tem origem latina e
quer dizer exatamente isto, “onde se faz e se produz de tudo”.
Herança de família, relíquia do
casamento de meus pais, de 1935.
Saladeira azul para saladas de
frutas e doces em compotas. Jarra e copos para água.
Licoreira e cálice para os
licores de figo, jabuticaba, pêssego, tangerina e tantas outras
dos tempos da fazenda Retiro dos
Ipês. Tradição portuguesa trazida pelos ancestrais da Vila de Gresufes,
freguesia de Balazar/Póvoa de Varzim, próxima à cidade do Porto. Nunca faltavam à mesa as goiabadas, marmelada, bananada, compotas de laranja da terra, cidra,
mamão, pêssego, manga, figo e de outras frutas cultivadas no pomar à porta da
cozinha da fazenda
Foto: Dilma Abreu- 2019
Sobre
o cultivo do marmelo, é interessante notar como a história se repete em todo o
Brasil. Na região aurífera e de diamantes dos Campos dos “Goyazes” não foi
diferente de Lavras, nas Minas Gerais. Com a decadência das jazidas de pedras
preciosas, também ali a agricultura foi a alternativa dos bandeirantes
portugueses. E foi em Luziânia, situada entre Cristalina e Brasília, que a
cultura do marmeleiro se desenvolveu, graças à altitude elevada e temperaturas
baixas no inverno. Segundo o historiador Gelmires Reis, o marmelo chegou 26
anos depois de fundado o povoado de Santa Luzia no sertão goiano, hoje
Luziânia, cidade de mais de 100 mil habitantes. Foi em 17 de novembro de 1770
que o português, João Pereira Guimarães, proprietário da fazenda Engenho da
Palma, plantou a primeira muda de marmeleiro, trazida já enraizada da
Bahia. A partir de então a cultura se
expandiu, especialmente na região do Quilombo do Mesquita, bem próximo à minha
chácara, na divisa do Distrito Federal com o estado de Goiás. Ali se produz,
ainda hoje, uma das melhores marmeladas do país. Encontrei na minha chácara,
livros de registros de exportações da Marmelada Santa Luzia para a Confeitaria
Colombo, no Rio de Janeiro. Eram necessários mais de trinta dias para se vencer
os 1.200 km de distancia, em lombo de burros até Uberlândia (400 km) e de lá
por trem de ferro. Acostumado que fui coma marmelada com queijo, no sul de
Minas, aqui em Brasília não passo vontade, pois as do Mesquita são excelentes.
Costume português, aqui também no Planalto Central!
Recentemente participei da Festa
do Marmelo, no Quilombo do Mesquita- Luziânia/GO
Com direito a ajudar na feitura
do doce, no tacho de cobre.
Foto do autor – Luziânia/GO, 2016
Delicia de doce, em caixetas de
madeira, como manda a tradição de 300 anos, trazida pelos imigrantes
portugueses para as minas de ouro de Minas Gerais e Goiás.
Éramos tão acostumados à
marmelada com queijo que, quando faltava o marmelo em lavras,
comprávamos a marmelada de Delfim
Moreira, com seu antigo distrito de Queimada, hoje Marmelópolis, sul de Minas,
um dos maiores produtores de marmelo do país.
Foto: Correio Braziliense
Marmelada é mesmo “uma delícia de
doce português”! Marmelada e queijo branco, produzidos na Quinta dos Jugais, na
Serra da Estrela, em Portugal. Lá como cá...
Foto: cortesia de Pedro Castro/Cidade
do Porto, Portugal - 2018
Tanto a produção de doces artesanais nas fazendas,
como a lã e o algodão para a confecção de tecidos e colchas, eram, portanto,
atividades de grande intensidade e que exigiam muita mão de obra. A mão de obra
era quase que exclusivamente feminina. Evidentemente que estamos nos referindo
à produção artesanal da família Sales e não da industrial, pois como é sabido, Lavras
possuía desde o ano de 1880 uma grande indústria têxtil, a Fábrica de Tecidos
União, localizada à margem esquerda do rio Grande. A fábrica contava com energia
elétrica própria e um porto fluvial, de navegação comercial, o Porto Dr Jorge. Mesmo
antes da instalação da fábrica de tecidos, o cultivo do algodão já era
tradicional em Lavras, desde o início do século XIX. A literatura nacional
registra esse importante cultivo agrícola das Lavras do Funil. O historiador
lavrense, Geovani Nemeth-Torres (http://historiadelavras.blogspot.com/2015/02/lavras-do-funil-saint-adolphe-1845.html), cita que o militar francês, Saint Adolphe, em seu livro de 1845,
discorre sobre suas viagens por Minas Gerais e nelas observou e descreveu a passagem
pela Vila das Lavras do Funil. Segundo o cientista, a vila de Lavras do Funil,
que contava com cerca de 12.000 habitantes, era grande produtora de víveres e seu
povo...
“applicando-se especialmente ao amanho e cultivo das terras, vendião por
alto preço aos mineiros os viveres de que necessitavão... Esgotadas as minas
aplicaram-se os habitantes à agricultura, comércio, e outros ramos de
indústria; assim observa-se neles certo ar de opulência que raramente se
encontra naqueles que se obstinam na extração de ouro que se tornou raríssimo.
Vê-se nessa vila oficinas de sapateiros e alfaiates. As mulheres fiam e fazem
teias de algodão, ao passo que os escravos se ocupam em descaroçá-lo com um
engenho próprio para este fim. O algodão fiado, como o que se acha em
rama, é transportado para o Rio de Janeiro em bestas muares, e em carros
puxados por bois que o levam até a vila de São João del-Rei. Vários ribeiros e
rios fertilizam o distrito desta nova vila, o qual se acha circunscrito ao
norte pelo Rio Grande, e ao sul pelo Verde, tributário do Sapucaí. Cultivam-se
nele em abundância algodoeiros, e
colhe-se igualmente grande quantidade de milho, arroz, feijões, laranjas, e
vários frutos do país, posta de parte a lavra do trigo, depois que os europeus
e americanos abasteceram de farinha todas as vilas e cidades marítimas do
Brasil. Avalia-se a população d’este districto em 12,000 habitantes...(Fonte:
SAINT-ADOLPHE, J. C. R. Milliet de. Diccionario Geographico, Historico e Descriptivo, do
Imperio do Brazil. Paris: J. P. Aillaud, 1845, tomo I, pp.
556-557.)”
Fac- símile da capa e folha de
rosto da publicação de 1845, de Saint Adolphe,
com descrição da Vila de Lavras
do Funil, que já contava com 12.000 habitantes
Foto: internet
Além do cultivo do algodoeiro, das pastagens e dos
cuidados pecuários para com o rebanho ovino, havia ainda os trabalhos de
beneficiamento, tanto do algodão colhido na roça como da lã de ovelhas e
carneiros (ovelha é a fêmea, carneiro o macho e cordeiro o filhote). Esta, a
lã, vinha infestada de carrapichos e cheia de oleosidade natural dos animais, o
que as tornavam duras, emplastadas e impermeáveis à água. A tosquia
propriamente dita, com longas tesouras, era feita por minha mãe, auxiliada pelos
camaradas (empregados da fazenda, alguns descendentes de escravos, como o
Paixão e Lázaro Simão, ambos com idade aproximada de 40 anos). Preparava-se,
então, a lã, num longo e demorado processo artesanal que incluía a lavagem para
a remoção do pó e da gordura natural nelas impregnadas. Enxutas ao sol sobre o
gramado eram em seguida desfiadas, manualmente, para eliminar as impurezas de
espinhos, carrapichos e outras ervas que se prendiam durante o pastoreio. Em
seguida, a lã era passada pela carda manual que a deixava em pluma, aerada e
levíssima, em forma de pequenos rolos cilíndricos, semelhante a o pão-bisnaga,
que flutuavam a uma simples brisa ou sopro, como as crianças gostavam de brincar,
ainda que repreendidas pelos adultos. Desta forma, a pluma era, então, fiada na
roda de fiar, passava-se à dobradeira. Desta saíam as meadas, que eram
submetidas o processo de tintura em grandes tachos com água fervente e
corantes.
As intensas atividades de beneficiamento
da lã e do algodão cabiam inteiramente às mulheres. Crianças também faziam pequenas
tarefas como a desfiação manual da lã (retirada das impurezas mais grosseiras
como carrapichos e outros) ou, simplesmente andavam pelos campos com toda a
família e agregados em busca das ervas que, fervidas, se transformavam em tinta
azul ou amarela, como a quaresminha do campo. Também íamos, as crianças, aos armazéns comprar os pacotinhos
de tinta Guarany para a complementação da variada tintura das meadas de lã. Depois
de secas e bem tingidas eram enroladas em novelos separados por cores. Por
último, havia o ritual de se levar os novelões multicoloridos para a tecedeira.
Esta tinha grandes teares artesanais e era só colocar os novelos nos seus
recipientes, variando as cores que dariam bonitos matizes às colchas. Quando as
colchas chegavam era só alegria. Então nossa mãe e suas auxiliares se punham a
costura-las, unindo as metades no sentido longitudinal de seu comprimento. Sim,
naquela época as colchas de lã eram tecidas em metades, nunca por inteiro, pois
o tamanho dos teares manuais era limitado.
Os equipamentos usados no beneficiamento
do algodão e da lã eram bem originais e alguns até rústicos. Foram trazidos de
Portugal, embora as cardas de aço fossem importadas dos EUA e da Inglaterra.
Ainda hoje conservo alguns deles como a roda de fiar, dobradeira, descaroçador
de algodão e um par de cardas. As cardas são peças retangulares, de uns 30
x15cm, semelhantes às raquetes de tênis de mesa. Na face interna há uma escova
de fino aço inoxidável, semelhante a uma escova de cabelo. Doces lembranças
desses equipamentos artesanais que tanto manuseamos na infância, ao lado das
guerreiras mulheres, responsáveis pela produção doméstica da lã e do algodão,
sem contar a doçaria de toda espécie. Era tudo que eu queria para o meu museu
sentimental montado na chácara, bem ao lado de pés de pera, figos, marmelos,
castanha portuguesa e goiabas. Doces em calda e a gostosa goiabada cascão não
faltam, como a cultivar o velho costume da fazenda de origem portuguesa. O
frio, as montanhas (consegui encontrar alguns morrotes em Brasília, ao lado da
chácara), os agasalhos e as colchas de lã de carneiro que eu próprio ajudei a
fazer, as frutas e os doces, compotas em calda, marmeladas e goiabadas...
ah..., ainda as tenho e literalmente, são doces lembranças dos costumes
portugueses cultivados pelas famílias de Lavras, terra do garimpo das lavras de
ouro de então.
Descaroçador - equipamento simples, artesanal, para
descaroçar o algodão que vinha da
colheita cheio de sementes entranhadas nos capulhos.
Era o “cavalo” dos meninos que imprimiam
maior ou menor velocidade nos cilindros girados pela manivela. Não raras
vezes os dedos iam juntos, como se fossem cana de açúcar na moenda...,
também sem direito a choro.
Na foto da direita, as cardas,
instrumentos para transformar a lã bruta em plumas. As plumas eram, então,
levadas à roda de fiar. Minha mãe era craque nessa operação e ninguém se
igualava à sua agilidade no manuseio das duas cardas e na fiação, com direito a
acrobacias como a demonstrar sua habilidade...
Fotos: internet
A famosa Roda de fiar, em minha
chácara, em Brasília. Os meninos dos anos de 1950
gostavam de gira-la com o pedal ou,
melhor ainda, com a mão, a 1.000km/h...
Longe dos adultos, lógico...
Sua função era transformar em fios as
plumas de lã que saíam das cardas. O fuso girava
com movimento transmitido por uma correia, de
barbante, que o ligava à roda maior.
Foto do autor- roda de fiar
adquirida em Resende Costa/S.J.D Rey, a capital da fiação artesanal no século
XIX e meados de XX
Tingir as meadas
de lã era uma operação perigosa, fervendo-se o material em grandes tachos de
cobre, com as tinturas. As tintas Guarany completavam as naturais colhidas no
campo.
Cabia aos
meninos ir ao armazém do Zé Chiemi ou do Julinho comprar as tintas Guarany.
Foto: internet
A experiência com a confecção de colchas
e agasalhos de lã, com tantas atividades artesanais na sua produção e com
envolvimento até das crianças, marcaram-nos para sempre. Certa feita, em visita
ao Peru, fomos levados a conhecer as lhamas, animal de produção de lã e carne, também
usado para transporte de carga, especialmente em regiões semiáridas. Foi
domesticada pelo povo inca e é bem maior que as ovelhas, também produzindo
maiores quantidades de lã e couro. São bastante disseminadas nos Andes
peruanos. Uma característica marcante desses animais é que, quando incomodadas,
cospem uma saliva malcheirosa bem na cara das pessoas. Por isso, a primeira
recomendação ao visitante é: não se aproxime! Os agasalhos de lã, naquele país,
sempre trazem estampas desse animal e sua lã se compara a da alpaca, utilizada
em roupas mais caras. Pela sua utilidade, na produção de lã e como animal de
carga, é bastante representado em pinturas nos povoados típicos dos Andes.
Conhecendo as
Lhamas, em Lima/Peru. Um detalhe, quem levou-me a esse passeio turístico foi o
Reitor da Universidade Nacional Agrária de La Molina- Perú, Prof. Alberto
Fugimori que, poucos anos depois deixou a universidade e foi eleito presidente
da república daquele país.
Foto do autor -
1981
Comprando
artesanatos de lã, de um nativo da etnia
“Cholo”, em
Ambato - Ecuador
Foto do autor -
1981
Um agasalho
típico dos Andes peruanos. Estampas e pinturas
de artistas
locais valorizam as lhamas, no transporte de carga e produção
de lã e couro
para agasalhos nas frias regiões montanhosas da cordilheira andina.
As pinturas ao
fundo retratam pequenos vilarejos peruanos e a utilização
das lhamas com meio de transporte de cargas.
Foto do autor -
2019
Finalmente, nesse contexto histórico
ainda há as reminiscências das árduas atividades da fazenda, com muitas e
diversificadas tarefas. Nossa mãe, mulher guerreira ao lado do marido, também
foi pastora de ovelhas. Cuidava delas com esmero, tosquiava-as na estação da primavera,
beneficiava a lã e mandava tecer as colchas que nos aqueciam no inverno. Ainda
hoje, mesmo depois de quase 60 anos de sua partida, posso dizer que ela foi
pastora não apenas das ovelhas verdadeiras, mas, sobretudo pastora de almas,
moldando o caráter de seus filhos com simples e eficazes exemplos de vida e
amor. A Mulher-Mãe é uma benção de Deus para a vida dos filhos. Sem ela não
haveria a família, local de aconchego, amor e desenvolvimento de nossa
personalidade e bem estar em nossas vidas. Ainda em passado recente extrapolava
demasiadamente essas ações, pois a mulher-mãe era, ao lado marido, também responsável
a par e passo pela produção de alimentos e agasalhos para toda família. As
colchas que nós, as crianças, ajudamos nossa mãe confeccionar, ainda hoje nos
aquecem no inverno, mas, muito mais que isso, aquecem a nossa alma, sempre! E
com a doçura do amor no coração. Neste mês de março, comemora-se o Dia
Internacional da Mulher, porém, seu dia pode ser hoje, amanhã e sempre, pois
nem mesmo sua partida em definitivo, há exatos 56 anos, nos fez esquecer, um
dia sequer, o seu valor, o amor e as doces reminiscências de sua presença. A
alma da mulher-mãe, com seu doce sorriso, vive em nossa alma para sempre!
Brasília, 30 de março de 2019
Paulo das Lavras
Antiga ponte do Funil, construída em 1869. Foi inundada
em 2002 pela
barragem da
Usina Hidrelétrica do Funil. O rio Grande com quase
100 metros de
lagura estreitava-se num funil de apenas 20 metros.
Ponto ideal para os bandeirantes e explordores de
ouro atravessarem,
a caminho dos
garimpos dos Campos dos Goyases.
Foto: Alessandro Ribeiro (editada)
Fazenda do
Registro, na estrada que liga Lavras à ponte
do Funil, num
dia de festa nos anos de 1970.
Foto: arquivos de
Renato Libeck
O Complexo
Ferroviário de Ribeirão Vermelho. A Rotunda, a Estação, a ponte ferroviária sobre
o Rio Grande construídos nos terrenos da Fazenda do Engenho, vendida à Cia
Ferroviária, no final do século XVIII, por minha bisavó e seu filho (meu avô),
criadores ovelhas e plantações de algodão para confecção
de colchas e tecidos artesanais. O porto fluvial (1890) ficava a pouco mais de
100 m da ponte, à direita da foto.
Foto: DuAlto Imagens
Aéreas 2016
O barco
conhecido por Vapor Dr Jorge atracando no porto fluvial de Ribeirão Vermelho.
Foto: arquivos de
Renato Libeck
Conhecendo
as origens das ovelhas da raça Merino, na França:
Visitando as
origens das ovelhas então criadas na fazenda de seus pais, o autor (de casaco marron), em La Bergerie
Nationale à Rambouillet – com o diretor
Barbezant ao centro e o diretor do Ensino Agrícola da DGER- Ministère de l´Agriculture da França,(último à
direita) junto o qual o autor respondia pelo convênio com o Ministério da
Educação. Na foto, ainda, dois estudantes de pós graduação conveniados.
Foto
do
autor – nov. 1986
Ovelhas da raça
Merino, lanígeras por excelência – La Bergerie Nationale.
Foto- Bergerie
Nationale
O belíssimo Castelo
de Rambuouillet, comprado pelo rei Luiz XVI, que tinha sua fazenda de caça aos
faisões ao lado e ainda mantida como centro de pesquisas
Foto
do
autor – nov. 1986
Chegar perto e
assistir, de surpresa, à revoada de faisões, na Fazenda Real, ao lado desse
belíssimo Castelo de Rambouiellet, foi uma experiência inesquecível
Foto- Bergerie
Nationale de Rambouiellet
Uma das preciosidades de Minas, os doces cristalizados, costume trazido pelo
imigrantes portugueses durante a febre do ouro, no início do século XVIII. O
clima temperado das
montanhas do sul de Minas é muito semelhante às do norte de Portugal, de onde veio a
maioria dos imigrantes. Nas lembranças do menino, restam as imagens subindo na enorme
figueira da fazenda cuja foto abre esta crônica, colhendo os figos para o delicioso doce em calda.
Foto: internet
Os portugueses
que vieram para o sul de Minas em busca do ouro também aportaram por aqui, no
Planalto Central, na região de Cristalina e Luziânia em busca das pedras
preciosas. Além do marmelo, cultivaram a pera, típica de clima temperado.
Também aqui, na região de Brasília, experimentei e deu certo o plantio de pera,
com farta colheita
Sim..., de fato,
Minas é mesmo a terra das preciosidades, da arquitetura das casas de fazenda,
as minerações, plantações e sobretudo dos sabores adocicados vindos da terra-mãe!