Era
o mês de setembro, de 2016 e os pais de Pedro Henrique, que contava apenas sete
anos de idade, viajaram de férias para o Rio de Janeiro. Foram dez dias que
ele, o menino, ficou com os avós e a tia Lu. Rotina estabelecida com escola
pela manhã, bem cedo, almoço em casa ou às vezes em restaurantes, academia duas vezes na semana com natação, futebol e judô, estudos diários tutorados pela tia Lu, comida farta com doces e
guloseimas (dizem que avós são para estragar os netos e os pais que os corrijam
depois...rsrs), brincadeiras na quadra de esportes, não dispensando a “guerra”
de travesseiros à noite, longe das broncas da vovó e finalmente dormir no
quarto de hóspedes, para onde o vovô também se deslocou para lhe fazer companhia,
cada qual em sua cama. Nos fins de semana contava com a companhia da priminha,
Sarah, na cidade ou na chácara, onde as atrações eram mais interessantes, pois
incluíam a piscina, extensos gramados para futebol, helimodelismo, lagos para pescaria, fruteiras (amoras e jabuticabas, frutas da estação), cães, galinhas e
outros bichos além do cavalo para um passeio em pelo. E ainda podiam pilotar,
de fato, o microtrator e passear no jipe sem capota, capaz de passar dentro da
lagoa mais rasa, derrapando e jogando lama para todos os lados. É paraíso para qualquer criança submetida à dura rotina
semanal de compromissos cronometrados.
Tudo certinho, novidades a cada dia ajudaram o
menino a “esquecer” os pais e concentrar-se na nova rotina, cercado de atenção
e carinho por todos da casa. Para o avô, era um prazer renovado a cada manhã leva-lo
até a escola. Era como reviver seu tempo de menino, com a diferença que
enfrentava o percurso a pé, acompanhado apenas por uma das irmãzinhas que
também estudava na mesma escola. Antes de sair para a escola, a vó nos reunia e
fazia a oração, agradecendo a Deus pela noite tranquila que passou e invocava
as bênçãos para o dia que se iniciava. Aí incluía-se a “viagem” de carro, de
seis quarteirões até a escola, pedindo a Deus a proteção para o motorista e o
menino, livrando-os do acidente. No caminho o menino observa atento o percurso
e as dificuldades do trânsito e as vezes até aconselhando: “deixa ele passar,
vovô”, quando um motorista mais apressado forçava a passagem de maneira
perigosa.
Dois
dias antes do retorno dos pais notamos alguma diferença no comportamento de
Pedro Henrique, a começar por querer saber detalhes do dia e hora de chegada,
pois havia sido informado sobre a volta deles que já se aproximava. Era uma
ansiedade normal para uma criança que foi privada da companhia de seus pais por
longos dez dias. Os pais foram recebidos pelo menino, à porta já aberta, com
indescritível alegria. Abraços e carinhos, conversas sem fim, a alegria do
presentinho recebido, chegou a hora da despedida dos avós e da tia Lu. Antes,
porém, a oração conjunta de agradecimento a Deus pelo retorno dos pais. Pedro
Henrique se ofereceu para fazer a oração, pois estva acostumado a fazê-la, quase
sempre à mesa, antes das refeições. E a faz com muita compenetração e
coerência, emocionando a todos. Mas, desta vez ele ultrapassou todos os limites
de sua compenetração, causando-nos surpresa pelos inusitados pedidos a Deus.
Após vários agradecimentos pela vida de todos, pelo alimento à mesa e que “Ele
não deixasse faltar na mesa de ninguém”, pediu a Deus que “conceda 120 anos de
vida à vovó, igual a Moisés”. Até aí a oração do menino continuava em ato
contrito, mas, após pedir a Deus “ que também “dê outro olho” para o vovô
enxergar melhor e não bater o carro na rua”...., ninguém conseguiu se segurar,
pois, de fato sou cego de um olho, por acidente aos cinco anos de idade e tenho
dificuldade no trânsito intenso, por falta de visão periférica do lado direito.
Pela
primeira vez em nossa casa, por mais de 45 anos, o momento sublime e de
respeito silencioso da oração, proferida por um membro da família, foi
quebrado. Não houve quem segurasse o riso pelos inusitados pedidos do menino de
sete anos. Primeiro o amor pela vovó, desejando-lhe uma longevidade como a de Moisés,
relatada na bíblia. Segundo, e mais surpreendente ainda, foi o tirocínio do
garoto conhecedor de minha deficiência visual e certamente deve ter presenciado,
durante os dias em que o levei para escola, alguma dificuldade que teria enfrentado no pesado trânsito de Brasília, especialmente no rush do horário de almoço e,
instintivamente, “pediu” a Deus que me concedesse “mais um olho”.... O mais
engraçado naquela inocência e amor infantil foi a justificativa de seu pedido a
Deus, completando para meu completo constrangimento: “... para o vovô enxergar melhor
e não bater o carro na rua.....”. Além das gargalhadas, a minha em primeiro
lugar e a consequente interrupção da oração, paguei mico
com seus pais que devem ter imaginado que cometi muitas barbeiragens no
transito, com o menino a bordo.
Bem,
foram dez dias muito felizes, na cidade e no campo. Tenho certeza que o netinho
gostou e nem sentiu tanto a falta dos pais. Mas, por via das dúvidas, vou
esperar a próxima viagem dos pais para ver se terão coragem de confiar ao avô a
guarda e o transporte escolar do menino...rsrs.
Criança
tem cada uma....
Brasília,
30 de setembro de 2016
Paulo
das Lavras
A chácara é um paraíso para as crianças de
hoje, submetidas
à dura rotina de 10 a 12 horas de agenda
diária na cidade.
Ciclone, acostumado a comer cenoura na mão
do menino, vem
correndo ao primeiro chamado e oferece espontaneamente a
cabeça para
um carinho. Alegria e sentimento de compartilhamento entre ambos
um carinho. Alegria e sentimento de compartilhamento entre ambos
Um olho novo para o vovô não
bater o carro na rua
120 anos de vida para a vovó...
Conhecendo o helicóptero de resgate dos
Bombeiros, aterrissado
na quadra, ao lado de casa, aguardando um acidentado.
No McDonald´s, crianças adoram
Esporte na quadra em frente de casa, com chute certeiro ao gol, o único da temporada. Cansei de jogar no gol para segurar seus pênaltis.
Descobriu que se chutasse para o lado direito do vovô marcava mais gols, devido à minha falta de visão. Talvez, e também por isso, pediu em oração que Deus desse um olho para o vovô
Pilotando um Grippen, caça sueco, novinho, em exposição da FAB
Pilotar o microtrator e ainda apanhar
ameixa amarela (nêspera),
bem acima da cabeça, é tudo que uma
criança quer
Bichinhos mansinhos e que gostam de
carinho não faltam na chácara